OPINIÃO

In dúbio pro reo

In dúbio pro réu, ou seja, "na dúvida, a favor do réu"

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Mãos entrelaçadas sobre uma mesa com um gravador e microfone, em um ambiente de entrevista.
Imagem: Freepik

As pessoas podem estar a léguas de distância da Academia e não terem nenhuma formação jurídica, mas, com certeza, elas sabem o sentido do brocardo latino “in dúbio pro réu, ou seja, “na dúvida, a favor do réu”.

Esse brocardo quer dizer que, ao decidir o mérito de um processo penal, se, depois de conhecer e examinar todas as provas, o juiz ainda estiver em dúvida, ele deverá decidir em favor do réu.

O brocardo latino em referência, no Direito brasileiro, tem assento constitucional. Nossa Constituição Federal, no bojo do artigo 5°, inciso LVII, consagra o princípio da presunção de não culpabilidade ou, se quiserem, presunção de inocência.

Mais que isso, o dispositivo constitucional que consagra esse princípio não por acaso se acha inserido no bojo dos direitos e garantias fundamentais, sendo, assim, um princípio-garantidor do devido processo legal que, inclusive, não pode ser suprimido da ordem constitucional via Emenda Constitucional.

Esse verdadeiro mandamento do devido processo legal possui também regramento no artigo 8º, item 2, da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), igualmente prevendo que “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente a sua culpa”.

No plano infraconstitucional, essa norma ganha concretude no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal que manda absolver o réu, se as provas forem insuficientes.

Nesse cenário, indaga-se: existe, em nossa ordem jurídica, algum momento processual em que a dúvida milite em favor da sociedade ou em que vigore o “in dúbio pro societate (expressão em latim que significa “na dúvida, a favor da sociedade”)?

Pois é. Esse tema vem sendo muito debatido na doutrina e na jurisprudência, e acho que, como posto, ele se encontra deformado, porque não há um princípio constitucional que mande, na dúvida, decidir em favor da sociedade, ou seja, contra o réu.

De onde saiu então essa ideia?

É que, no catálogo dos direitos fundamentais constitucionais, nós temos o Tribunal do Júri, a quem o legislador cominou a competência exclusiva para julgar os processos envolvendo os crimes dolosos contra a vida.

Não existe um princípio que ordene que, na dúvida, o réu deva ser remetido a julgamento pelo “Tribunal do Povo”. Porém, existe uma norma constitucional que assegura a competência do Tribunal do Júri para julgar casos de crimes dolosos contra a vida.

Não é que o juiz, na dúvida, tenha que decidir em favor da sociedade. É que ele não tem competência para julgar o mérito, ponderando sobre quem tem a melhor prova, acusado ou defesa. O juiz não pode procurar dúvida onde não lhe cabe decidir. Quando houver vertente probatória que acolha as teses acusatórias e defensivas, o que cumpre ao juiz faz é encaminhar a causa àquele a quem a Constituição incumbiu de julga-la: o Júri.