A Irmã Scalabriniana Rosita Milesi, 79 anos, nascida na localidade de Santos Anjos, interior de Farroupilha, ganhou os noticiários nos últimos dias por conta do reconhecimento de uma vida. Na segunda-feira (14), em Genebra, na Suíça, ela foi laureada globalmente com o Prêmio Nansen 2024, concedido pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), órgão ligado à Organização das Nações Unidas (ONU).
A farroupilhense foi apenas a segunda pessoa brasileira a receber tal distinção. O pioneiro foi o catarinense Dom Paulo Evaristo Arns, laureado em 1985.
40 anos de auxílio a necessitados
Advogada, ativista e formadora de movimentos sociais, Rosita Milesi defende há quase 40 anos os direitos e a dignidade de pessoas em movimento, tendo ajudado pessoalmente milhares de indivíduos ao facilitar o acesso a abrigo, alimentação, cuidados de saúde, treinamento de idiomas, geração de renda e documentação no Brasil. Porém, é desde a sua juventude que ela se dedica à religiosidade. Aos 15 anos decidiu ser irmã na congregação, participando desde então de diversas causas sociais.
Na área jurídica ela também foi fundamental na formulação de políticas públicas. Seu trabalho na Lei de Refugiados de 1997, por exemplo, ajudou a ampliar os direitos das pessoas refugiadas em consonância com a Declaração de Cartagena de 1984, assegurando que a lei contemple mais ações para proteger, incluir e empoderar pessoas forçadas a fugir, em conformidade com os padrões internacionais.
Atualmente, Irmã Rosita é diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH), que tem sede em Brasília (DF) e se dedica integralmente à assistência jurídica e humanitária e à promoção da integração laboral e sociocultural dos migrantes, refugiados e apátridas.
“Me sinto feliz por ter a oportunidade de
continuar essa missão junto às pessoas”
Após ser reconhecida pela ACNUR, Rosita Milesi, entre um voo e outro, tendo em vista as muitas viagens que está fazendo atualmente, concedeu entrevista exclusiva ao Portal Leouve, na qual falou sobre seu sentimento em poder ajudar migrantes e refugiados:
“Já completo mais de 35 anos de atuação nesta área, em diversas regiões, localidades, em missões sempre voltadas ao atendimento, promoção, integração dos migrantes e refugiados. É uma causa que realmente me anima, alegra e me dá muita satisfação. Me sinto feliz justamente porque tenho a oportunidade de continuar essa missão junto a pessoas que, pela própria característica, foram forçadas a deixar seu país por causa das guerras, da fome, violação dos direitos e até por questões climáticas”, explica.
Segundo a ativista, o prêmio da ONU a deixou honrada, porém, ele se estende a pessoas que também estiveram de alguma forma envolvidas nesta conquista pessoal:
“Eu dedico o prêmio a tantas pessoas que fizeram parte da minha trajetória. Em primeiro lugar, aos refugiados, refugiadas, migrantes e tantas organizações com que eu pude trabalhar e me apoiaram, à minha congregação, à minha família e às organizações internacionais que sempre me abriram as portas, dando a possibilidade de avançar no atendimento às pessoas”.
“Crianças e jovens mais conscientes terão
a coragem de construir um mundo melhor”
“Gostaria de deixar uma mensagem às crianças e aos jovens: vocês são a nossa alegria de hoje, são a força que nós, mais idosos, muitas vezes já não temos. São criativos, dinâmicos, generosos, e tenho certeza que nós podemos nos sentir muito felizes com a vivacidade de vocês. Tenho a certeza que, mais conscientes de tantas questões e problemas que precisam ser superados na sociedade atual, terão a dedicação, coragem, vontade e dinamismo de deixar e construir um mundo melhor”, diz a Irmã Rosita, ao comentar sobre as questões ambientais que forçam pessoas a saírem de seus territórios e recomeçar suas vidas.
A religiosa também deixa um apelo sobre dois temas em evidência: a preservação ambiental e as guerras pelo mundo:
“Não podemos continuar desgastando a natureza. Ela não se vinga de nada, ela, em última análise, sofre as consequências do tratamento que lhe dão. Sobre as guerras, sejam contra elas, proclamando às autoridades que utilizem uma arma muito mais eficaz e benéfica, que é o diálogo, para construir a paz“.
Papel crucial na proteção de pessoas deslocadas
O Prêmio Nansen, concedido pela ONU, foi criado em 1954 e recebeu este nome em homenagem aos trabalhos do humanitário, cientista, explorador e diplomata norueguês Fridtjof Nansen, sendo uma premiação que reconhece e celebra os trabalhos de indivíduos, grupos ou organizações prestados a refugiados. Todos os anos o reconhecimento é outorgado a um indivíduo ou organização que dedicou seu tempo e fez a diferença na tarefa de proteger pessoas deslocadas à força de suas casas.
Em caráter inédito, o ano de 2024 marca o reconhecimento da atuação de mulheres no contexto humanitário, destacando seu papel crucial na busca de soluções para que as pessoas deslocadas de forma forçada em todo o mundo estejam protegidas e integradas nas comunidades de acolhida.