Outro dia, um programa de televisão exibiu uma reportagem com uma decisão polêmica, sob o título: “Justiça proíbe enfermeira e filho de morarem juntos por causa da Covid-19.”
Em apertada síntese, uma Juíza de primeira instância do Estado do Paraná, sem ouvir a parte contrária, concedeu a chamada ‘tutela de urgência’ ao pai, para modificar a guarda do filho de 7 anos de idade que, antes, por consenso, por ocasião da separação judicial do casal, era compartilhada.
A mãe do infante mora em outro Estado, no Mato Grosso, onde exerce, segundo mostrava, com orgulho, a profissão de enfermeira, para a qual fez um juramento ético se salvar vidas.
Com o começo da Pandemia da Covid 19, a mãe do menor foi para a linha de frente, vindo a trabalhar inclusive na UTI no combate ao coronavírus.
Diante da situação, e em sendo a guarda compartilhada, a mãe ajustou com o pai, “provisoriamente”, de o filho ir ficar um período morando com o genitor, até que a situação epidêmica estivesse mais controlada. De consenso, então, o menino foi residir no Paraná com o pai.
Oh vida lida! No início, tudo saiu às mil maravilhas, franqueado que era o amplo acesso da mãe ao filho por tecnologias de comunicação via internet.
Porém, em dado momento, o pai começou a opor empecilhos aos contatos remotos entre mãe e filho, indo mesmo ao ponto de ingressar em juízo para postular a modificação da guarda do menor, não apenas com a alegação de que o menino já estaria completamente adaptado à residência e ao convívio paterno, mas, também, pelo risco que a profissão da mãe oferecia ao infante, mesmo a genitora estando, atualmente, em trabalho administrativo e de “home care”.
Na decisão, a Magistrada se justificou dizendo que, no caso examinado, estava configurado o perigo de dano à criança, sobretudo, diante da profissão exercida pela genitora, enfermeira, e pelo fato de a pandemia da Covid-19 ainda não estar controlada em nenhum estado da Federação.
Por conseguinte, mãe e filho foram proibidos pela Justiça de morarem juntos, em razão da profissão de enfermeira que a genitora exerce por cerca de dois anos e da qual depende o seu sustento e o sustento do filho.
A Juíza em comento, na sequência, designou audiência de conciliação para o mês de abril do ano de 2021, o que, na prática, implica afastar mãe e filho por mais de ano, postura judicial que, além de constituir uma violação humanitária (pela carência de profissionais da saúde para o enfrentamento da epidemia, avilta, também, o direito inarredável da criança de conviver com ambos os genitores.
Mais: vejo a decisão judicial como acolhedora de um dissimulada e perversa alienação parental do genitor que, antes, deveria ser tratada com repúdio pelo Poder Judiciário, uma vez que a ciência já demonstrou que as crianças, em sua imensa maioria, quando sem comorbidades, são assintomáticas.
Se risco houvesse, este seria para a própria mãe que, consciente, não age senão conforme os protocolos de saúde. A exposição dela ao vírus não passou, na minha experiência, de um pretexto, de um ardil, do qual o pai lançou mão para buscar outra coisa que não estava exatamente fundada no receio de o filho se contaminar. Pena que a juíza não enxergou esse pretexto e entrou na vala comum de decisões de massa, mas que não atendem o interesse de uma criança, quando se trata de separá-la do convívio da mãe, o que já é por si só um desfavor pela data de designação da audiência conciliatória.
Dizem que a genitora já interpôs recurso e eu não espero, sinceramente, que o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, reforme, incontinenti, essa decisão tão vazia de justiça, enquanto virtude.