OPINIÃO

Espaços públicos: o coração das cidades

O espaço público bem planejado é um grande equalizador social.

Róger Ruffato/Prefeitura de Caxias do Sul/divulgação
Róger Ruffato/Prefeitura de Caxias do Sul/divulgação

As cidades da Serra Gaúcha carregam consigo uma forte herança comunitária. Foram fundadas por imigrantes que erguiam igrejas, escolas e salões de festas em mutirão, onde o coletivo sempre esteve acima do individual. É por isso que, historicamente, os espaços públicos assumem um papel central na vida urbana dessas cidades. Praças arborizadas, largos com coretos, calçadões com bancos de madeira. Eram nesses lugares que a vida acontecia, e é neles que ela precisa continuar a acontecer.

O espaço público bem planejado é um grande equalizador social. Não importa o bairro onde se mora, a profissão que se exerce ou o poder aquisitivo. A praça pertence a todos. Mas para que esse pertencimento seja verdadeiro, ela precisa ser acolhedora. Não basta ter canteiros floridos: é preciso oferecer sombra real, bancos confortáveis, segurança, acessibilidade, banheiros, áreas para crianças, infraestrutura para idosos, sinalização clara. O espaço público não pode ser pensado só para ser contemplado, ele precisa ser vivido.

Infelizmente, em muitas cidades, a lógica da valorização imobiliária vem tomando o lugar do planejamento humano. Árvores são retiradas para dar lugar a estacionamentos, calçadas estreitas dificultam o caminhar de mães com carrinhos de bebê ou cadeirantes, e o mobiliário urbano muitas vezes não considera nem o conforto térmico, nem a necessidade de permanência. Quando o espaço público se torna hostil, a cidade perde parte de sua alma.

Um grande exemplo disso é Balneário Camboriú. A cidade cresceu exacerbadamente nos últimos anos, diminuindo espaços de convívio visando a valorização imobiliária. Em tempo, o Projeto de Reurbanização da Orla entrou em ação em 2023, compreendendo um alargamento de calçada, espaço para ciclistas e um novo calçadão apenas para pedestres. Além disso, a nova proposta prevê recuperação de vegetação da restinga e plantação de novas árvores, entre outros aspectos. 

Na Serra, temos exemplos potentes de boas práticas: requalificações de praças que dialogam com a história local, projetos que mantêm o piso de basalto e as árvores centenárias, integração de áreas de lazer com feiras e eventos culturais. Mas também convivemos com espaços que passaram por reformas que os transformaram em locais vazios, cenográficos, onde ninguém quer ficar, porque falta vida, falta escuta, falta identidade.

Projetando Relações: Espaços Públicos e a Vida Urbana

Projetar uma praça é, na verdade, projetar uma relação. Entre as pessoas e a cidade. Entre o passado e o presente. Entre o tempo de correr e o tempo de descansar. Um banco de praça pode ser mais do que um mobiliário: pode ser o lugar onde alguém vai sentar para esperar a filha sair da escola, onde duas vizinhas vão conversar depois de anos, onde um senhor vai ensinar o neto a andar de bicicleta.

Na arquitetura, às vezes esquecemos o valor do gesto mínimo. Mas ele é poderoso. Criar espaços públicos que convidam ao encontro, à convivência e à permanência é garantir que a cidade seja mais do que um aglomerado de edifícios, é permitir que ela seja um organismo vivo, pulsante e generoso.