
Poucos conceitos jurídicos sofreram tantas modificações quanto o de “família” não só pelas novas conformações familiares, mas especialmente porque ele foi, aos poucos, sendo impregnado pela ideia de vínculos de amor e de afeto, inclusive em detrimento de laços formais e biológicos.
Sim, o vinculo de amor e afeto passou a ser também para o Direito a base de de carinho, acolhimento, educação, bem-estar físico e psicológico que criam relações jurídicas em diferentes formas, inclusive aptas a afastar os próprios vínculos biológico e consanguíneo, criando parentesco socioafetivo.
Vejam que aquilo que era impensável, por exemplo, no meu tempo de faculdade, a adoção póstuma, hoje já é possível sob o fundamento da sócio afetividade consolidada. Quando se iria imaginar, nos idos dos anos 80, que uma pessoa, no futuro, poderia vir a ser adotada por uma pessoa já morta?
Adoção Póstuma e o Direito
A adoção póstuma, em síntese, é a possibilidade de formalizar a adoção após a morte do adotante, que pode ocorrer em duas situações principais: o falecido iniciou o processo de adoção em vida e faleceu antes da sentença, ou o processo não foi iniciado, mas a intenção de adotar foi demonstrada de forma clara e inequívoca.
Isso já é possível, segundo precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), com fundamento no artigo 42, parágrafo 6°, do Estatuto da Criança e do adolescente.
Nancy Andrighi, Ministra relator do caso paradigmático, explicou que, havendo “consistente e irrefutável comprovação de que adotante e adotado construíram durante a vida um inequívoco relacionamento socioafetivo de pai/filha, um possível pedido judicial de adoção, antes do óbito, teria apenas selado com o manto da certeza o que a vida em comum de ambos já confirmara: que eles já teriam incorporado e dado publicidade de que formavam, por vínculos socioafetivos, uma relação de pai e filha”.
Em ambos os casos, a adoção póstuma garante à criança ou ao adolescente todos os direitos de herança e filiação, com efeitos retroativos à data do óbito.