Após três meses consecutivos de alta, o percentual de brasileiros endividados permaneceu em 78,8% em junho de 2024, o mesmo registrado no mês anterior. Os dados são da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada mensalmente pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), e divulgados nesta quinta-feira (4). O resultado aponta para uma estabilização na demanda por crédito pelas famílias, que estão demonstrando maior cautela para evitar o acúmulo de dívidas.
“A manutenção do índice de endividamento revela certa preocupação com a inadimplência por parte das famílias, que têm aproveitado o momento para amenizar as dívidas, em vez de fazer novos compromissos”, disse o presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, José Roberto Tadros.
Impactos da crise climática no Rio Grande do Sul
O levantamento também trouxe à tona os impactos da crise climática no Rio Grande do Sul. Sem os dados do estado, o endividamento teria recuado para 78,4% e as contas em atraso teriam aumentado em 0,1 ponto percentual (p.p.), atingindo 28,7%. Esses números mostram que metade do aumento apresentado nos dados nacionais de inadimplência (0,2 p.p.) foi causado pela alta demanda de crédito das famílias gaúchas, que estão reconstruindo suas vidas após os desastres climáticos.
“Apesar da alta de 0,4 p.p. no endividamento no Rio Grande do Sul, a inadimplência no estado diminuiu 0,2 p.p. no mês, mostrando que, mesmo com a tragédia, as famílias continuaram com capacidade de honrar seus compromissos. Esse efeito indica que as medidas de apoio ao estado começaram a surtir efeito na prática, trazendo algum alívio ao orçamento das famílias gaúchas”, afirmou o economista-chefe da CNC, Felipe Tavares.
Perfil do crédito em melhora
Em junho, a Peic apresentou uma melhora no perfil do crédito. Houve uma redução no número de famílias brasileiras que se consideram “muito endividadas” para 17,2% (-0,6 p.p.); enquanto a faixa identificada como “pouco endividadas” aumentou para 33,7% (+0,6 p.p.). Já o grupo de famílias que não terão condições de pagar dívidas manteve-se no nível de maio deste ano e de junho do ano passado, em 12%.
Por outro lado, o percentual total de famílias com dívidas em atraso aumentou para 28,8%, um crescimento de 0,2 p.p. em relação a maio deste ano, permanecendo abaixo do registrado em junho de 2023. Houve também um aumento de 0,3 p.p. no percentual de famílias com dívidas em atraso por mais de 90 dias, alcançando 47,6% do total de endividados em junho deste ano – o maior percentual de 2024.
“Os atrasos estão perdurando por mais tempo, o que revela certa dificuldade de honrar os compromissos, deixando as famílias mais receosas em fazer novos parcelamentos no momento”, avalia Felipe Tavares.
Apesar do maior nível de inadimplência, o percentual dos consumidores que possuem mais da metade dos rendimentos comprometidos com dívidas registrou uma queda de 0,4 p.p. em comparação ao mês anterior, atingindo 20,4%.
“Para conseguir ter melhor controle financeiro, as famílias contam com prazos mais longos para pagamento das suas contas. Tanto que o percentual de famílias comprometidas com dívidas por mais de um ano avançou para 32,8%, o maior nível desde abril de 2022”, destaca o economista.
Cartão de crédito lidera
O cartão de crédito continua sendo o maior responsável pelo endividamento das famílias, sendo utilizado por 86,4% dos endividados. Este valor representa uma retração de 0,5 p.p. em relação ao mês anterior e de 0,6 p.p. na comparação com junho do ano passado.
Carnês e cheque especial continuaram perdendo representatividade na carteira de crédito dos consumidores em relação ao ano passado (-0,4 p.p. em ambos os casos). Já o financiamento imobiliário apresentou o maior crescimento anual (1,5 p.p.), resultado do mercado de crédito com juros mais acessíveis. Este foi o maior percentual de utilização (8,9%) desde fevereiro de 2022.
Gênero e renda
Em junho de 2024, o endividamento avançou entre as mulheres (+0,1 p.p.). Em contrapartida, entre os homens, o índice reduziu em relação a maio (-0,1 p.p.), mas se manteve superior em comparação a junho do ano passado. Tanto mulheres quanto homens apresentaram aumento nas contas em atraso, sendo de 0,3 p.p. para elas e 0,1 p.p. para eles.
A pesquisa Peic revela um cenário de cautela por parte das famílias brasileiras diante do endividamento, com sinais de melhora no perfil de crédito, apesar dos desafios impostos pela crise climática no Rio Grande do Sul e o aumento na inadimplência de longo prazo.