A docência não é algo financeiramente atrativo no Brasil, ainda que seja por meio dela que todas as demais profissões são impulsionadas. Mas um dos aspectos pelos quais eu, pessoalmente, gosto dela é que ser “Professor” é uma maravilhosa via de mão dupla: sempre se ensina e sempre se aprende algo. É isso que torna a docência fantástica para mim, sob todos os aspectos, inclusive humanos.
Ao longo da minha vida jurídica, nunca trabalhei muito no âmbito da infância e juventude, nem na parte da proteção, com absoluta prioridade, como manda o artigo 227 da Constituição Federal, nem na parte repressiva que respeita ao combate aos atos infracionais.
Também nunca questionei o porquê de a responsabilidade penal ser fixada pelo legislador ordinário em 18 anos. Bastou-me a explicação tradicional de ser um critério biopsicológico adotado pelo legislador; igualmente escrevi alguns textos questionando se a Constituição permite ou não, a partir do conceito de direitos fundamentais e de “cláusulas pétreas”, modificar esse critério na via infraconstitucional.
Pois bem. Em uma aula de Direito Penal, fui surpreendida pelo aluno “Alexandre”, ao apresentar, em grupo, um seminário com uma abordagem sobre os crimes do ECA, e ter me ensinado sobre um marco revolucionário inicial da fixação da responsabilidade penal em 18 anos de idade, com vistas à evolução da proteção às crianças e ao adolescente, marco que eu desconhecia: o caso do menino Bernardino.
Bernardino foi um menino preto, pobre que, aos 12 anos de idade, ganhava a vida como engraxate nas ruas do Rio de Janeiro quando, em determinada ocasião, se deparou com um cliente que se recusou a pagar pelo serviço que Bernardino lhe havia prestado.
O menino, com o discernimento próprio de quem tem apenas 12 anos de idade, irritou-se e acabou jogando tinta no cliente, o que, à época, foi o suficiente para levá-lo à prisão, onde Bernardino permaneceu durante quatro semanas, período em que foi gravemente violentado por 20 companheiros de cela e, adiante, levado à Santa Casa (em estado deplorável), sendo, depois, devolvido às ruas.
Vivendo e aprendendo, eu soube que o Caso Bernardino impulsionou que, em 12 de outubro de 1927, o Presidente da República Washington Luiz assinou a primeira lei que ficaria conhecida como o “Código de Menores”, a primeira legislação brasileira que voltou os olhos à realidade vivida pelas crianças e pelos adolescentes no país. Mais: que foi por essa precisa razão que o dia da assinatura foi escolhido como o “Dia da Criança”.
Sem prejuízo de perfilar a ideia que temos muito avançar no ECA, tanto em matéria de proteção, quando em matéria de repressão aos atos infracionais bárbaros cometidos por menores, não posso negar que adorei a lição e o marco de pesquisa que recebi do meu aluno.