
Dificuldades financeiras, psicológicas e sociais. Todos os anos, muitos imigrantes de países africanos, em sua ampla maioria haitianos, chegam a Bento Gonçalves em busca de oportunidades e melhores condições de vida.
Somente no final de 2019, cerca de 25 haitianos chegavam semanalmente a Bento Gonçalves, em busca de oportunidades de emprego, segurança e vindos de situações de guerras e desastres ambientais no seu país.
Com a situação de Pandemia do Coronavírus, este número caiu significativamente, apesar de haver uma grande quantidade de haitianos na faixa de 20 a 30 anos de idade já estabelecidos em Bento Gonçalves.
Além de Bento, em que há uma forte concentração de haitianos, vários desses imigrantes também se encontram em Caxias do Sul, principalmente, além de outras cidades da Serra Gaúcha.
Preconceito, dificuldades de comunicação, distância da família e uma árdua disputa por uma vaga no mercado de trabalho, de forma a ter não só o seu sustento, mas também ajudar familiares que ficam no seu país de origem.
Estes são alguns dos inúmeros desafios enfrentados por esses imigrantes ao abandonarem os seus países em busca de uma vida melhor na Serra Gaúcha.
Em 2019 por meio da presidente do CRAS (Centro de Referência da Assistência Social) de Bento Gonçalves, Lisiane Pires, foi implementado na cidade uma Comissão Intersetorial para auxiliar os imigrantes de países de etnia negra que residem em Bento Gonçalves, que em sua grande maioria, são mesmo haitianos.
Uma das principais dificuldades enfrentadas por esses imigrantes está relacionada a busca por moradia e o preconceito por parte de muitos proprietários de imóveis:
“É bastante comum haitianos chegarem aqui, a gente auxiliar neste processo na busca de alugar algum apartamento e os sócios-proprietários colocam como pré-requisito para os inquilinos o fato de não serem haitianos”, expõe Lisiane.
O trabalho da comissão inicialmente consiste em cadastrar os novos haitianos que chegam na cidade e a partir de então, identificar as principais necessidades de cada um. Por meio da comissão, são distribuídas cestas básicas a inúmeros haitianos que residem em Bento Gonçalves, que em sua maioria, moram no Bairro Conceição.
Neste último mês de março, também foi criado em Bento Gonçalves o NAS, que é um Núcleo de Ação Social, também voltado para o trabalho específico com os imigrantes de países de origens africanas. Neste núcleo, ainda está sendo estudado a questão da implementação do auxílio aos indígenas.
“Tanto o NAS, quanto o CRAS, servem como uma espécie de referência a essa comunidade haitiana, tanto os que já estão no município, quando os que chegam a Bento Gonçalves”, afirmou a presidente do CRAS.
A realidade no mercado de trabalho
Apesar de partirem para a capital do vinho em busca de emprego e qualidade de vida, esta não é a realidade de uma boa parte desses imigrantes que estão na cidade.
Segundo informações da presidente do CRAS, Lisiane Pires, mais de 50% deses imigrantes encontrão-se atualmente desempregados.
Outra função do Núcleo, é fazer um intermédio entre esses imigrantes e o mercado de trabalho. E a realidade não é nada animadora, segundo contou Lisiane. Em muitas das empresas às quais os imigrantes são encaminhados, grande maioria delas somente recebe os currículos e não encaminha os haitianos às entrevistas.
Além do preconceito, a presidente do Centro de Referência da Assistência Social, afirma que essa realidade também é reflexo da dificuldade de comunicação. A maioria dos empresários não compreende o idioma dos haitianos e também não possuem paciência de forma a inseri-los na cultura organizacional e assim possibilitarem a sua adaptação.
Pensando nisso, outro projeto que está sendo pensado pelo NAS, é o oferecimento de aulas de crioulo (dialeto haitiano) e também de francês, outro idioma falado por todos eles.
A ideia seria ministrar oficinas dos idiomas para um ou dois funcionários das empresas que se interessarem, de forma com que esses empreendimentos possam estar mais inseridos na cultura dos imigrantes e consequentemente, possam abrir mais as portas do mercado de trabalho.
As vagas em oficinas também seriam destinadas a profissionais das secretarias municipais, de forma a melhorar a comunicação com os órgãos públicos de Bento Gonçalves.
As oficinas seriam realizadas de forma totalmente voluntária e ministradas pelos próprios haitianos.
Se por um lado há desemprego, por outro, muitos desses imigrantes trabalham na área de indústrias, no setor de produção, e também na construção civil e ainda também há muitos informais. Uma quantidade significativa desses imigrantes trabalha como cozinheiros em uma série de estabelecimentos do ramo alimentício de Bento Gonçalves.
Apesar de estarem inseridos nessas áreas, os cargos e salários não refletem a capacitação de muitos deles, conforme relatou Lisiane. Apesar de muitos possuírem uma ocupação, muitas vezes o cargo não condiz com suas respectivas formações, que em pelo menos 60% dos casos, são formações técnicas e até superiores:
“Todos eles falam pelo menos dois idiomas, pois além do dialeto do Haiti, lá eles também falam francês. Então só por este fato eles já deveriam largar na frente no mercado de trabalho em muitos casos, aliado a formação técnica ou superior que muitos deles possuem. Mas não é a realidade, muitas empresas infelizmente ainda são muito fechadas para o ingresso dos haitianos”, lamenta.