OPINIÃO

Arquitetura como cartão-postal

A arquitetura é, por essência, uma manifestação da cultura de um povo.

Arquitetura como cartão-postal Arquitetura como cartão-postal Arquitetura como cartão-postal Arquitetura como cartão-postal
Interior de adega com barris de vinho e porta de madeira com detalhes dourados
Imagem: Cristina Mioranza/Divulgação

O turismo é uma força poderosa. Nas cidades da Serra Gaúcha, ele tem sido responsável por impulsionar a economia, fomentar o comércio local, atrair investimentos e manter vivas tradições culturais. Mas junto com esse impulso vem também uma transformação silenciosa e nem sempre benigna, que é a forma como a arquitetura e o espaço urbano vêm sendo adaptados, ou moldados, para agradar ao olhar de quem visita, muitas vezes em detrimento de quem vive.

A arquitetura é, por essência, uma manifestação da cultura de um povo. Ela fala do tempo, dos recursos disponíveis, das crenças, da forma de trabalhar e de viver. Nessas cidades, as fachadas de pedra, as muretas em basalto, as janelas de madeira e os telhados íngremes contam histórias de imigração, de resistência, de adaptação ao clima e ao solo. São signos de pertencimento.

Contudo, à medida que o turismo se torna um dos principais vetores de crescimento, cresce também a tentação de “embelezar” as cidades para o olhar externo. Praças reformadas com plantas exóticas que pouco dialogam com o bioma local, centros históricos com fachadas restauradas de maneira cenográfica, construções novas que tentam simular um estilo antigo, mas sem o conteúdo que justifica a forma. Cria-se uma estética engessada, uma arquitetura de vitrine que sacrifica a autenticidade em nome da atratividade.

É importante lembrar que o visitante não busca apenas uma imagem bonita. O que o cativa é a experiência de um lugar genuíno. O aroma da comida típica, a textura da pedra original, o ruído das ruas de paralelepípedo, os sotaques que se cruzam na feira da praça. São os detalhes imperfeitos e sinceros que tornam uma cidade memorável.

A arquitetura, nesse contexto, tem uma responsabilidade dupla. Por um lado, ela precisa abrigar a nova demanda turística com infraestrutura de qualidade: estacionamentos, acessos, sinalizações, banheiros, hospedagem. Por outro, ela deve preservar e valorizar aquilo que é único, insubstituível. Isso requer planejamento urbano cuidadoso, onde o crescimento é orientado com base em diretrizes culturais e ambientais, e não apenas comerciais.

Turismo e Preservação: Um Equilíbrio Necessário

Turismo e preservação não são inimigos. Pelo contrário, podem e devem caminhar juntos. O que falta muitas vezes é escuta. Escutar os moradores, os arquitetos locais, os historiadores, os urbanistas. Evitar soluções rápidas e espetaculares. Lembrar que a beleza de uma cidade não está apenas no que se vê, mas no que se sente ao andar por ela.

Que possamos, então, construir um turismo que não esvazie nossas cidades de sentido, mas que as fortaleça como espaços vivos, enraizados em sua própria história. Uma arquitetura que não se limite a servir de fundo para selfies, mas que continue sendo o palco onde se vive a identidade de um povo.