Bento Gonçalves

Repercute em sessão da Câmara de Bento do dia 19 de abril reportagem sobre inquérito MPxPasin

MP investiga suspeitas de improbidade administrativa em contratos milionários da prefeitura de Bento

Promotor Alécio Nogueira apura condições em que contratos foram celebrados
Promotor Alécio Nogueira apura condições em que contratos foram celebrados

A divulgação do inquérito civil instaurado pelo Ministério Público estadual (MP) para investigar a administração do ex-prefeito Guilherme Pasin por improbidade administrativa por suspeitas de irregularidades na contratação de duas prestadoras de serviço terceirizadas sem licitação, repercutiu na cidade e na Câmara de Vereadores durante a sessão legislativa desta segunda-feira, dia 19 de abril. No sábado, 17, o ex-prefeito divulgou uma nota afirmando ter “convicção da regularidade dos procedimentos e da licitude de tudo que foi realizado”, afirmou ele. Na Câmara, pelo menos sete vereadores se referiram à investigação, quatro deles da bancada do PP, partido do ex-prefeito.

A repercussão na sessão legislativa foi provocada pela publicação de uma reportagem pelo Portal Leouve (você pode ler aqui), que demonstrou as denúncias envolvendo a contratação das empresas MedSaúde, em abril de 2020, e APL, em junho do ano passado, e revelou que uma das empresas e, de acordo com a Justiça, o sócio de outra aparecem citados em conversas interceptadas pela Polícia Federal no âmbito da Operação Camilo, que desbaratou um esquema de corrupção na prefeitura de Rio Pardo em maio de 2020. O MP investiga, além dessa ligação, a dispensa de licitação, irregularidades nas contratações, suspeitas de superfaturamento e a ligação de Fernando De La Rue com as duas empresas.

O vereador Agostinho Petroli (MDB) afirmou que as denúncias são conhecidas, e que ele e o ex-vereador Moisés Scussel abordaram o tema à época das contratações. “Os sócios de uma eram os representantes de outra, e vice-versa. Já era de conhecimento público. A gente vê que tem alguma coisa errada”, disse.

Petroli afirmou que suspeitas eram conhecidas desde o ano passado

Rafael Fantin (PSD), o Dentinho, afirmou que solicitou ao Executivo informações referentes aos casos em fevereiro, mas não recebeu resposta. “Não sei se os fatos acusatórios são verídicos ou não, isso cabe à Justiça. Mas eu gostaria que nossos pedidos de informação sejam respondidos. O fato novo é que esses mesmos sujeitos foram citados pelo TRF4”.

Os vereadores governistas saíram na defesa de Pasin, procuraram desmentir as informações divulgadas pela reportagem, praticaram imprecisões e defenderam uma possível candidatura do ex-prefeito a um cargo legislativo nas próximas eleições. O vereador Jocelito Tonietto (PSDB) resumiu o sentimento dos situacionistas: “Por que essa perseguição de um ex-prefeito reeleito com 60% dos votos? Por que estão pegando no pé do Pasin? Por que ele pode ser um nome para o ano que vem?”

Os quatro vereadores do Progressistas adotaram o mesmo discurso de perseguição ao ex-prefeito e também defenderam, alguns explicitamente, a candidatura de Pasin à Assembleia Legislativa gaúcha ou para a Câmara Federal nas eleições de 2022. Líder do partido, Thiago Fabris foi o primeiro a fazer a defesa de Pasin, e preferiu atacar a imprensa que abordar as denúncias: “Insistir que o nosso ex-prefeito praticou essas irregularidades, isso só o TCE pode dizer”, afirmou.

O mais exaltado nas acusações à imprensa foi Anderson Zanella, que reclamou da matéria não trazer o nome do repórter e estranhou “coincidência por parte da oposição política” com a reportagem. Exaltado, ele fez ameaças: “É fácil vir aqui jogar vento para ver a coisa acontecer. Esse filme eu já assisti aqui, e não foi nada bom para quem semeou o vento”. Zanella cometeu uma série de imprecisões. Ele afirmou que a APL, que substitui a CCS na contratação de terceirizados, não estaria impedida de contratar com governos em junho de 2020, quando foi contratada pela prefeitura, mas esqueceu de dizer que o impedimento já vigorava quando o contrato foi prorrogado, sem licitação, pela segunda vez. Zanella também errou ao afirmar que “Pasin não é investigado em qualquer operação”, no que foi acompanhado pelo colega de partido Davi Da Rold. A reportagem revelou que o inquérito civil do MP é público, e pode ser consultado sob o número “IC 00723.000.221/2021”. Outra imprecisão dos vereadores governistas foi afirmar que tanto a empresa como De La Rue não são investigados pela Operação Camilo. A informação consta claramente da reportagem, que ressalta que eles aparecem citados em conversas dos acusados de envolvimento no esquema interceptadas pela polícia, o que reforça as suspeitas.

Os dois vereadores, que não conquistaram a vaga nas eleições, mas assumiram como suplentes porque o governo atual escalou os eleitos para o secretariado, também lembraram os problemas anteriores com a empresa de mão de obra terceirizada e com a empresa que teria apresentado o menor preço (leia abaixo). Da Rold chegou a afirmar que a empresa “não tinha sede” e possuía ligações com a CCS. “Poderia dizer que era uma empresa laranja”, acusou.

Promotor solicitou documentos para averiguar novas denúncias

O promotor Alécio Nogueira, que conduz o inquérito em Bento Gonçalves, afirmou que já solicitou as informações referentes ao caso para averiguar essas supostas ligações. Ele deverá ouvir os envolvidos, assim como o ex-prefeito. Em dezembro de 2020, a prefeitura afirmou à reportagem que decidiu não contratar a empresa GFG, e encaminhou um relatório de diligência onde comprovaria que existiam conexões societárias entre a GFG e a CCS, e garantiu não ter conhecimento sobre a ligação entre a MedSaúde e a APL. Durante o inquérito do MP, que ainda está em fase de instrução e não ouviu os envolvidos, a prefeitura terá nova oportunidade para esclarecer o caso.

Entenda o caso

O contrato com a APL pôde ser celebrado com dispensa da licitação porque o Tribunal de Justiça do estado (TJRS) suspendeu em maio do ano passado o processo licitatório por divergências no edital quanto à exigência de comprovação de experiência prévia da empresa contratada na prestação do serviço. Como o contrato com a CCS se encerraria no mês seguinte e não havia interesse da prefeitura em renovar o compromisso, depois de impasses recorrentes entre a prefeitura, a empresa, os servidores terceirizados e o sindicato da categoria, a prefeitura alegou que não haveria tempo hábil para corrigir o processo licitatório e, assim, comprovou o caráter emergencial da manutenção dos serviços e a contratação não precisou seguir os ritos legais previstos em um processo licitatório.

Mas o que causou estranheza foi que a prefeitura não contratou a empresa que ofereceu a melhor proposta, mas preferiu pagar cerca de R$ 1,5 milhão a mais para fechar com a APL, o que ocorreu em junho de 2020. A falta de uma explicação oficial e o prejuízo aos cofres públicos provocaram um questionamento do MP: a resposta da prefeitura para ter preterido a empresa que apresentou o menor preço foi que existiam conexões societárias entre a empresa que apresentou a menor proposta e a CCS. O expediente do MP estava paralisado desde julho, e agora será objeto do mesmo inquérito que investiga o contrato.

A contratação da MedSaúde em 2020 também foi feita sem licitação e chamou a atenção do MP. Isso porque a comissão de licitação da prefeitura de Bento desclassificou as outras duas empresas concorrentes – o Instituto de Saúde Santa Clara e a empresa Sander Serviços Terceirizado – na fase de credenciamento, por não terem cumprido uma norma burocrática de identificação do envelope com a proposta. As empresas apresentaram recurso porque o erro não pode ser consertado pelos representantes legais da empresa que participavam da concorrência. O contrato com a MedSaúde foi prorrogado em abril por até 180 dias, de acordo com o Diário Oficial Eletrônico de 31 de março, ainda que o aditamento não constasse no portal da transparência até esta quinta-feira, dia 15, e foi alvo de críticas e revisões desde sua celebração original, primeiro porque os valores apontados como pagamento para determinadas funções estavam superfaturados, depois porque um dos sócios da empresa tinha contrato com o município como coordenador da Unidade de Pronto Atendimento 24H; agora, pela ligação com a operação da Força Tarefa que envolve o MP e a PF.