COLUNA

Resiliência mental: o lado invisível da crise climática

Segundo a Associação Americana de Psicologia, entre 25% e 50% das pessoas expostas a um desastre climático têm risco de desenvolver problemas de saúde mental

Pessoa sob guarda-chuva em tempestade, com raios e cidade ao fundo. Cena noturna e chuvosa.
Imagem: Freepik

Enquanto discutimos infraestrutura verde, tecnologias limpas e políticas ambientais, há uma dimensão da crise climática que permanece frequentemente silenciosa: o impacto profundo que as mudanças ambientais causam em nossa saúde mental.

Nos últimos anos, especialmente após as enchentes devastadoras que atingiram o Rio Grande do Sul em 2023 e 2024, tenho observado algo que vai além da destruição material: o surgimento de uma ansiedade coletiva, um peso emocional que muitas pessoas carregam, mas poucos sabem nomear.

É o que os especialistas chamam de eco-ansiedade – aquela sensação de impotência e medo crônico diante da magnitude dos desafios ambientais. Quando as previsões meteorológicas mostram probabilidade de chuva e ventos fortes, já nos pegamos revivendo os desastres recentes: “Será que vai acontecer de novo? Estamos seguros? Nossos parentes e amigos estão seguros?”

A eco-ansiedade, também conhecida como ansiedade climática, é um sentimento generalizado de angústia e preocupação com as consequências das mudanças climáticas. Incêndios florestais, chuvas torrenciais, enchentes, animais feridos, ondas de calor extremo são alguns eventos que, além de afetar diretamente os envolvidos, trazem uma sensação de desamparo, desesperança e tristeza profunda.

Segundo a Associação Americana de Psicologia, entre 25% e 50% das pessoas expostas a um desastre climático têm risco de desenvolver problemas de saúde mental. Esses números revelam uma realidade que não podemos mais ignorar.

Por isso falamos que as questões ambientais vão além de estruturas físicas – é um olhar para as pessoas e como elas têm sido impactadas financeiramente, fisicamente e emocionalmente frente às mudanças climáticas.

E você já se pegou pensando nisso? Ou talvez sentindo uma sensação de impotência? Se a resposta for sim, você não está sozinho.

Estudos recentes mostram que mais de 60% dos jovens relatam sentir ansiedade climática, e 45% afirmam que isso afeta significativamente seu dia a dia. No Brasil, após eventos climáticos extremos, os casos de transtornos de ansiedade aumentam em até 30%.

O trauma é uma resposta emocional natural e compreensível diante de uma ameaça e das lembranças dos eventos ocorridos. É o nosso sistema emocional reagindo à percepção de que o mundo que conhecemos está mudando de forma acelerada e, muitas vezes, imprevisível.

Paradoxalmente, quanto mais sabemos sobre as questões ambientais, maior pode ser nossa angústia. É como se carregar a consciência ambiental viesse acompanhado de um fardo emocional. Conhecer os dados sobre desmatamento, poluição, extinção de espécies e mudanças climáticas pode gerar uma sensação constante de urgência que, se não bem manejada, pode levar ao esgotamento.

Lembro-me de uma conversa com uma colega que trabalha com educação ambiental. Ela me disse: “Taisa, às vezes sinto que estou gritando no vazio. Ensino sobre sustentabilidade, mas quando vejo a lentidão das mudanças, me sinto exausta.” Essa exaustão não é apenas física – é emocional, mental e espiritual.

Estratégias para Cultivar Resiliência Mental

  1. Pratique o “Foco no Controlável”
    Em vez de se sobrecarregar com todos os problemas ambientais do mundo, concentre-se no que está ao seu alcance. Você pode não conseguir parar o desmatamento da Amazônia sozinho, mas pode escolher produtos sustentáveis, reduzir seu consumo e influenciar positivamente sua comunidade.
  2. Pratique a Validação Emocional
    Reconheça que essa angústia é real e compreensível. Não minimize seus sentimentos – eles são uma resposta natural a uma ameaça real. Permita-se sentir sem julgamento, mas não permaneça paralisado por esses sentimentos.
  3. Conecte-se com a Natureza
    Paradoxalmente, uma das melhores formas de lidar com a ansiedade ambiental é passar tempo na natureza. Caminhar em um parque, observar pássaros, cuidar de plantas – essas atividades nos reconectam com a beleza e a força regenerativa do mundo natural.
  4. Limite a Exposição a Notícias Negativas
    Estar informado é importante, mas a exposição constante a notícias ambientais alarmantes pode ser prejudicial. Estabeleça limites: escolha momentos específicos para se atualizar e balance com conteúdos que mostrem soluções e histórias positivas.
  5. Cultive Redes de Apoio
    Conecte-se com pessoas que compartilham suas preocupações ambientais, mas que também valorizam o equilíbrio emocional. Participe de grupos de ação climática que priorizem o bem-estar dos membros.

O Autocuidado Como Ato de Resistência

Aqui está uma verdade que demorei para compreender: cuidar da sua saúde mental é um ato de resistência ambiental. Quando você está emocionalmente equilibrado, tem mais energia para ações sustentáveis. Quando está esgotado, tende a tomar decisões menos conscientes.

O autocuidado não é egoísmo – é estratégia. Você não pode cuidar do planeta se não cuidar de si mesmo primeiro. E isso inclui:

  • Estabelecer limites saudáveis entre sua vida pessoal e suas preocupações ambientais
  • Praticar atividades que trazem alegria e renovam sua energia
  • Buscar ajuda profissional quando a ansiedade se torna excessiva
  • Lembrar-se regularmente das razões pelas quais vale a pena lutar por um mundo melhor

A Força da Esperança Ativa

Diferente do otimismo cego, a esperança ativa é aquela que reconhece os desafios, mas escolhe focar nas possibilidades de mudança. É a esperança que se traduz em ação, mesmo quando os resultados não são imediatos.

Nos últimos meses, acompanhando a reconstrução do Rio Grande do Sul, tenho visto exemplos extraordinários de esperança ativa. Pessoas que perderam tudo, mas escolheram reconstruir de forma mais sustentável. Comunidades que se uniram para implementar soluções baseadas na natureza. Jovens que, em vez de se paralisarem diante da crise, se tornaram agentes de mudança.

O Papel da Comunidade

A resiliência mental diante da crise climática não é uma jornada individual. Precisamos uns dos outros. Precisamos de espaços onde possamos expressar nossas preocupações sem julgamento, compartilhar estratégias que funcionam e celebrar juntos cada progresso.

Quando nos isolamos com nossas ansiedades ambientais, elas tendem a crescer. Quando as compartilhamos em comunidade, encontramos perspectivas, apoio e, principalmente, a força que vem da ação coletiva.

Transformando Ansiedade em Ação

A ansiedade e o medo relacionados às mudanças climáticas, quando bem canalizados, podem se tornar uma força motriz para mudanças positivas. É o sinal de que nos importamos profundamente com o futuro do planeta. O desafio é transformar essa preocupação em ação sustentável, sem nos esgotarmos no processo.

Algumas perguntas que podem ajudar nessa transformação:

  • Que pequena ação posso tomar hoje que esteja alinhada com meus valores ambientais?
  • Como posso usar minha ansiedade como combustível para mudanças positivas?
  • Que tipo de apoio preciso para manter meu engajamento sem me esgotar?
  • De que forma posso contribuir para soluções, em vez de apenas me preocupar com problemas?

Quando Buscar Ajuda Profissional

É importante reconhecer quando a eco-ansiedade ultrapassa limites saudáveis. Considere buscar apoio profissional quando:

  • A ansiedade ambiental interfere significativamente nas atividades diárias
  • Você evita notícias ou conversas sobre meio ambiente por causa do desconforto emocional
  • Sente desesperança constante sobre o futuro do planeta
  • Experimenta sintomas físicos como insônia, perda de apetite ou ataques de pânico relacionados a questões ambientais

O Convite para o Equilíbrio

A crise climática é real, urgente e merece nossa atenção. Mas nossa saúde mental também é real, urgente e merece cuidado. Não precisamos escolher entre cuidar do planeta e cuidar de nós mesmos – podemos e devemos fazer ambos.

Sua resiliência mental é um recurso precioso para a causa ambiental. Quando você está bem, toma decisões mais conscientes, tem mais energia para ações sustentáveis e se torna um exemplo inspirador para outros.

Que tal começarmos a tratar nossa saúde emocional com a mesma seriedade que tratamos a saúde do planeta? Porque, no final das contas, são duas faces da mesma moeda: um mundo saudável precisa de pessoas saudáveis para cuidar dele.

Próximos Passos

Para colocar essas reflexões em prática, convido você a:

  • Fazer uma autoavaliação: Em uma escala de 1 a 10, como está sua saúde mental em relação às questões ambientais?
  • Identificar uma ação: Escolha uma pequena ação concreta que pode implementar esta semana
  • Compartilhar: Divulgue este texto com alguém que possa se beneficiar dessa reflexão
  • Conectar-se: Busque ou crie espaços de diálogo sobre sustentabilidade e bem-estar em sua comunidade

E você, como tem cuidado da sua resiliência mental diante dos desafios ambientais? Que estratégias têm funcionado para manter o equilíbrio entre consciência e bem-estar?

Lembre-se: você não precisa carregar o peso do mundo sozinho. Podemos construir um futuro mais sustentável cuidando uns dos outros no processo.