Mais uma vez, o Rio Grande do Sul se vê submerso, não apenas em água, mas em um
desolador sentimento de déjà vu. As chuvas torrenciais, as secas severas e os ventos
implacáveis não são mais eventos isolados, mas capítulos recorrentes de uma mesma e
trágica narrativa. E a cada novo desastre, a pergunta se impõe com a força de uma
enchente: por que, diante de tantos avisos, persistimos no mesmo ciclo de inércia?
A ciência, há muito, aponta o Sul do Brasil como uma das áreas mais vulneráveis às
mudanças climáticas. As pesquisas não são segredos guardados a sete chaves, mas
alertas públicos, disponíveis a quem quiser ver. No entanto, experimentamos dias terríveis e
seguimos agindo como se fosse possível superar tamanha adversidade sem um plano
estratégico consistente, sem revisão e, crucialmente, sem um diálogo interno que abrace as
vozes dissonantes. A responsabilidade, sim, recai sobre quem governa, pois a informação
chega, mas os avisos são, inexplicavelmente, desconsiderados. Quem atua na área sabe:
as tendências de chuvas extremas, secas prolongadas e ventos cada vez mais fortes no Rio
Grande do Sul não apenas são reais, mas prometem se intensificar.
O Presente Inadiável: Reconstruindo Cidades
O que mais falta para que nossas lideranças revisem seus planos e ousem fazer diferente?
O escritor James Lovelock já sentenciava que teríamos de trabalhar para reconstruir
cidades destruídas por desastres ambientais no futuro. Esse futuro, caros leitores, não é
uma projeção distante; ele é o nosso presente. Não há mais margem para delongas ou para
a complacência. Você sabia que todo o CO2 que lançamos na atmosfera hoje leva entre 50
e 200 anos para se dissipar — e isso sem considerarmos tecnologias de remoção
atmosférica? Diante dessa realidade implacável, não temos mais o luxo de apenas pensar
em metas e indicadores de redução; precisamos, urgentemente, agir.
Outro ponto vital é compreender que o ambiente não se curva às fronteiras municipais ou
estaduais; ele perpassa regiões, nações e continentes. As soluções, portanto, precisam ser
conjuntas, idealmente articuladas por regiões com características hidrológicas e geográficas
semelhantes. Contudo, não se observa, com a sinceridade que o momento exige, um
engajamento pleno de algumas lideranças (é fundamental ressaltar: não todas) em
concretizar essa mudança. O discurso, muitas vezes, ainda se sobrepõe à ação efetiva. É
claro que certas transformações exigem prazos – curto, médio e longo – e não se resolvem
em um ou dois anos, como o tempo decorrido desde os últimos grandes desastres ambientais em 2024. Mas se o planejamento não for iniciado agora, a resolução nunca virá.
A Interconexão Global e a Visão Sistêmica
É imperativo que governantes e líderes de organizações reconheçam que os problemas
ambientais são a base, o pano de fundo, para profundos problemas sociais e econômicos.
Não se trata apenas de preservar o meio ambiente por si só – embora isso seja vital –, mas
de entender que os estragos, os custos, são sentidos diretamente na economia e na vida
das pessoas. Quando lares são destruídos, vidas desestruturadas, e a produção agrícola
comprometida, o custo financeiro é imenso, para além do dano ambiental. Precisamos, com
urgência, de novas lideranças, preparadas e munidas de uma visão sistêmica, que
compreendam que fazemos parte de um todo interconectado. As ações locais reverberam
globalmente; a Amazônia, por exemplo, não é uma entidade isolada de nós ou do resto do
mundo. Vivemos em um planeta interconectado, em uma teia delicada onde nossos
impactos não se confinam ao nosso quadrado – eles transcendem os limites de nossa casa,
nosso município, nosso estado e nosso país.
Até que essa percepção sistêmica se consolide – que as questões ambientais são, no
fundo, a raiz de nossas mazelas sociais e econômicas –, continuaremos a lamentar as
perdas sem construir o futuro. Acredito firmemente em futuros possíveis, construídos em
harmonia entre pessoas, negócios e o meio ambiente; futuros que gerem valor para o todo.
É tempo de transformar o alerta em ação, a repetição em revisão e a inércia em uma
liderança verdadeiramente conectada com o amanhã que já é hoje.