Opinião

Manicômio tributário

Manicômio tributário

Todos sabemos que a carga tributária no Brasil é muito alta. Pagamos muito tributo. E não recebemos o devido retorno do estado.

Mais grave é a complexidade. A confusão do sistema. Existem leis demais. Contraditórias entre si. Contrárias à Constituição. Leis que desrespeitam sólidos princípios jurídicos e regras claras. Agridem a razão, a lógica. E não entregam a Segurança Jurídica.

Estamos prestes a pagar o IPTU. O que poucas pessoas estão atentas é que o IPTU pode ser reajustado todos os anos. Historicamente esse aumento é baixo. Mas tudo depende do índice utilizado para atualização. Alguns Municípios utilizam o IPCA, ou INPC, índices que medem a inflação. Mas outros utilizam o IGP-M, que no acumulado dos últimos 12 meses está em 24,5%.

É isso mesmo. O IPTU desses Municípios está prestes a aumentar em ¼ – um quarto. Quase 25% no período de um ano.

Municípios como Bento Gonçalves e Farroupilha, por exemplo, têm atualização pelo IGP-M previstas, como no ano passado. Mas há declarações de intenção de redução pelo governo, ou até projetos de lei. Já Porto Alegre é pelo IPCA (3,92%), e Caxias do Sul por índice de 4,88%.

Vivemos num manicômio jurídico tributário em que atores não conversam entre si. Uns falam. Outros não ouvem. Poucos veem. E novas normas são introduzidas no sistema diariamente. Seja por novas leis, portarias, instruções normativas, seja por decisões das Cortes Superiores.

Existe o princípio da “não surpresa”. Derivado da Segurança Jurídica. Por ele, nenhum contribuinte deveria ser surpreendido com alguma norma que o coloque em situação gravosa. Situação prejudicial a si ou seu negócio. Cabe ao cidadão ter previsibilidade das normas que vão lhe afetar.

Mas muitas delas estão entranhadas no emaranhado jurídico. Estão escondidinhas. Com expressões técnicas do tipo “atualização do valor venal da planta de valores de imóveis”. O contribuinte acaba se dando conta só quando é tarde demais.

Um aumento de 25% no período de um ano é francamente um confisco. Mas a Justiça permite a utilização do IGPM, embora não tenha se manifestado sobre aumentos dessa magnitude.

O importante é que ainda há tempo!

Até o final do ano os vereadores podem modificar a lei para valer para o IPTU no próximo dia 1º de janeiro. Cabe a nós pressionarmos eles a modificarem. Senão a única solução será buscar a Justiça com a alegação de confisco. Leva tempo. O processo pode demorar. E o desgaste é imenso.

O ideal é o Parlamento modificar o índice já. Ou mesmo extinguir a atualização. Afinal, qual seria a razão de haver um imposto aumentando todos os anos? Principalmente após um ano como esse de 2020. Em que a atividade econômica reduziu fortemente, afetando pessoas e empresas. No qual a dificuldade financeira da sociedade é notória. Temos pouquíssimo tempo. Mas dá.

Da próxima vez que eu caminhar por aí, nesse manicômio, e aparecerem alguns Napoleões Bonaparte, seguirei curioso para saber por que suas mãos estão dentro da casaca. Meu palpite é que eles escondem o Doc do IPTU. Pertinho do coração.

(Foi o advogado e jurista gaúcho Alfredo Augusto Becker quem usou pela primeira vez a expressão Manicômio Jurídico Tributário na década de 1960. Fazendo referência a obra Manicômio Tributário Italiano do Professor italiano Lello Gangemi. O fenômeno é mundial)