Há quatro anos escrevi um artigo apontando que as propostas de reforma tributária então discutidas estavam esquecendo talvez do seu principal objetivo: a promoção da segurança jurídica.
O que vemos hoje em dia é o mesmo silêncio. E, o pior, em um cenário mais agravado ainda.
O discurso comum das propostas que estão tramitando no Congresso (PEC 45 e PEC 110) aponta dois objetivos principais: racionalização e neutralidade.
A racionalização é ponto pacífico. O sistema é caótico. Mesmo para especialistas o tributário é bastante complexo.
A neutralidade objetiva manter a carga tributária. Parece piada, mas este ponto é posto como um objetivo a ser perseguido, como se fosse algo muito benéfico. O contribuinte gostaria de redução da carga tributária. Mas isto, infelizmente, não ocorrerá. O problema com a neutralidade é que alguns setores da economia terão a sua carga reduzida, o que implica necessariamente que outro setor tenha a carga aumentada. Daí o impasse e a demora.
De qualquer forma, o que nos preocupa é o silêncio sobre a segurança jurídica. É o silêncio quanto a impor mecanismos que efetivamente promovam a segurança jurídica.
Segurança jurídica aqui neste texto, tem o significado de afastar as imprevisibilidades do sistema para o contribuinte, de permitir o planejamento do contribuinte e a sua confiabilidade no sistema.
Dentre tantas, ao menos três medidas podem impactar positivamente a vida de todos:
(i) A proibição da modulação dos efeitos de decisões judiciais favoráveis ao contribuinte.
Talvez este seja o principal item. O seu objetivo é promover a confiabilidade do cidadão na Constituição. A proibição de modulação de efeitos de decisões judiciais favoráveis aos contribuintes é medida benéfica pois, por um lado, reforça a ideia de supremacia da constituição.
Ora se um tributo é inconstitucional (contrário à Constituição), logicamente ele é contrário à Constituição para o futuro e para o passado.
Por outro lado, o efeito benéfico seria o maior cuidado na aprovação de tributos novos, ou aumento dos existentes, por parte do Congresso, já que se reduziria o incentivo pernicioso à “inconstitucionalidade útil”. Bem como a necessidade de julgamentos mais rápidos pelo Judiciário, pois à medida que o tempo passasse o passivo somente se avolumaria para o estado.
(ii) A proibição de instituição/majoração de tributos por meio de Medida Provisória.
O objetivo é promover a representatividade e devolver o protagonismo ao Congresso. Atualmente as MPs são utilizadas frequentemente em matéria tributária, criando obrigações imediatas aos cidadãos, sem a análise dos seus representantes – o Congresso. Mais grave ainda, quando uma MP não é convertida em lei, ela, em regra, permanece com seus efeitos ativos para o passado.
Com isso se evitam surpresas aos cidadãos, pois o trâmite dos projetos de lei no Congresso permite que os termos sejam conhecidos pelos destinatários e discutidos com a calma necessária.
(iii) A determinação de que todos os tributos têm que respeitar a anterioridade anual e nonagesimal.
Ou seja, todos os tributos instituídos, aumentados ou reinstituídos (por revogação de benefícios) somente podem valer para o ano seguinte. E, se estivermos no final do ano, ainda tem que ser acrescentado o prazo de 90 dias.
Este item diz respeito à previsibilidade do sistema. Hoje, diversos tributos valem imediatamente ou no mesmo ano fiscal. Por exemplo, o ICMS-combustíveis, o PIS/COFINS-combustíveis, do PIS/COFINS-operações financeiras, da CIDE-combustíveis, do IPI, do Imposto sobre Operações Financeiras, dentre outros.
É o caso clássico de mudança de regras no meio do jogo. A insegurança do cidadão é evidente. Ele inicia um exercício fiscal planejando suas atividades e verifica que seu planejamento de nada adiantou, pois os tributos foram elevados no meio do caminho.
Obviamente que não são as únicas medidas, mas elas impactariam positivamente o sistema e trariam inegável segurança, em nosso entender.
A reforma já está velha. E, mais que isto está parada. A reforma tributária tal como está posta trará mais insegurança ao contribuinte.
É hora de revitalizarmos a reforma tributária. Mantendo as ideias boas lançadas até aqui, mas mexendo naquilo que realmente importa.