Memória LEOUVE

As lágrimas do crocodilo

As lágrimas do crocodilo

A queda de Eduardo Cunha, que renunciou ontem à presidência da Câmara Federal de forma dramática, com direito a choro, acusações, garantia de inocência, compromisso com a família e temor a Deus, é um tombo fenomenal.

 

Um dia a lagoa havia mesmo de secar, jacaré.

 

O homem que foi o presidente mais forte da Câmara em décadas e que devorava inteira suas vítimas, sai do cargo isolado, abatido e enrolado até o último dente com a Justiça.

 

No Congresso, seu destino ainda não está selado, mas mesmo que alguns afirmem que a renúncia é mais uma manobra para manter o mandato, até os impávidos dragões da guarda presidencial sabem que será difícil reverter a queda final.

 

Sem a presidência, resta saber se o crocodilo Cunha terá mesmo o casco duro pra manter o mandato, manter seus poderes ilimitados, sua rede de proteção inexpugnável e sua influência inesgotável.

 

A última mordida de Cunha é tentar garantir um aliado na presidência, mas nem isso deve prosperar, porque nem mesmo o temerário interino Temer vai aceitar mais um fantasma no seu armário, ele que já tem um representante de cunha como líder de seu governo no Congresso.

 

Como o crocodilo que chora ao devorar a presa mais pelo sabor que por arrependimento, Cunha chorou ao renunciar ontem pra saborear uma sobrevida na selva do Planalto Central.

 

No topo da cadeia política, Cunha não tem predadores naturais, e quer construir uma saída menos desonrosa. Porque se não, corre o risco de que ele cumpra a promessa e leve pelo menos 150 deputados contigo.

 

E saindo da presidência, ele sai da mira dos 11 magistrados do STF e leva seus julgamentos pra turma do amigo Gilmar Mendes.

 

Mas sem o mandato, ele perde o foro privilegiado, vira bolsa de madame e vai parar na mira de Sérgio Moro.

 

 

E é aí que as lágrimas do crocodilo, que só parece chorar a sorte da presa quando na verdade é sua forte mandíbula pressionando as glândulas lacrimais, podem virar um choro de verdade. A caminho da cadeia.