A 9ª Vara Federal de Porto Alegre determinou a suspensão das licenças de operação da Usina Termelétrica Candiota III e da Mina de Carvão Mineral Candiota, localizadas no município de Candiota, na Região da Campanha gaúcha. A sentença, proferida pela juíza Rafaela Santos Martins da Rosa, foi publicada na sexta-feira (22), mas divulgada apenas nesta segunda (25).
A decisão atende a uma ação civil pública movida por três entidades ambientais — Núcleo Amigos da Terra Brasil, Instituto Preservar e Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural. No processo, as organizações alegaram descumprimento reiterado de normas ambientais, além da ausência de medidas efetivas para uma transição energética justa diante dos impactos climáticos da exploração do carvão.
Réus no processo
Entre os réus figuram o Ibama, a Aneel, a Eletrobras CGT Eletrosul (atual Âmbar Uruguaiana Energia S.A., que adquiriu a usina em 2024), o Estado do Rio Grande do Sul, a Fepam e a Companhia Riograndense de Mineração (CRM).
Segundo as autoras da ação, o Ibama e a Fepam teriam autorizado os licenciamentos sem considerar o componente climático, mesmo tratando-se de atividades altamente poluidoras. A União e o Estado, por sua vez, teriam incentivado a continuidade da matriz energética baseada no carvão, em desacordo com compromissos internacionais de redução de gases de efeito estufa (GEEs).
Fundamentação da Sentença
Na decisão, a magistrada reconheceu o caso como um “litígio climático de cunho estrutural”, embasando-se em relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
A juíza destacou que a queima de combustíveis fósseis é uma das principais responsáveis pelo aquecimento global e que regiões mais pobres sofrem de forma desproporcional os efeitos de eventos extremos, como secas, enchentes e ondas de calor.
Ela citou os impactos recentes no Rio Grande do Sul:
- ciclo de secas severas entre 2020 e 2024;
- onda de calor histórica em 2025;
- perdas agrícolas expressivas;
- enchentes que atingiram 90% dos municípios gaúchos em 2024, quando o estado chegou a decretar calamidade pública.
Determinações da Justiça
- Ibama e Fepam suspendam as licenças da usina e da mina até que sejam incluídas condicionantes climáticas nos processos de licenciamento;
- União e Estado do RS apresentem, até 31 de janeiro de 2026, um Plano conjunto de transição energética justa para o setor de carvão mineral;
- O Fórum Gaúcho de Mudanças Climáticas tenha sua composição revista em até 30 dias, com maior participação de sociedade civil e comunidade científica.
O descumprimento das medidas acarretará multa diária de R$ 10 mil para União, Estado e órgãos licenciadores, além de R$ 2 mil ao dia em caso de descumprimento da adequação do Fórum.
Foram marcadas duas audiências de monitoramento das medidas: em outubro e dezembro de 2025.
Repercussão
A decisão representa um marco no debate sobre transição energética no Brasil, ao estabelecer de forma inédita a necessidade de integração do componente climático nos licenciamentos ambientais de atividades altamente poluidoras.
Ainda cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).