A projeção de recuo na safra de trigo da Argentina, estimada em 26,3% pela Bolsa de Cereais de Buenos Aires, tem chances ampliadas na produção gaúcha do cereal, projetada, este ano, para ser a maior da história. Segundo dados da Bolsa de Cereais, a Argentina deve colher uma safra de trigo de cerca de 16,5 milhões de toneladas, muito inferior aos 22,4 milhões de toneladas do ciclo anterior. O motivo apontado para a quebra é a escassez hídrica e a ocorrência de geadas, que puxaram para baixo a expectativa quanto à qualidade da colheita, cuja parcela considerada boa ou excelente também recuou de 14% para 9% na última semana.
A situação pode abrir uma importante lacuna à exportação de trigo do Rio Grande Sul, que aposta nas vendas externas para equilibrar a relação entre oferta e demanda no mercado interno. “Estimamos que o Estado deva colher mais de 5 milhões de toneladas de boa qualidade”, afirma o consultor da Safras & Mercado Élcio Bento. No entanto, Bento ressalta que 90% do trigo importado pelo Brasil provém do país vizinho, que reduziu a previsão de exportações de 16,5 milhões de toneladas, no ciclo anterior, para 9,8 milhões de toneladas este ano, das quais 8 milhões de toneladas já foram negociadas.
“Há muito pouco trigo da safra nova para ser declarado. Não sabemos quanto já foi comprado pelo Brasil, que necessita de 6 milhões de toneladas por ano para suprir sua necessidade”, explica. A expectativa de escoar a produção do Rio Grande do Sul ao Paraná, que amarga perdas devido às chuvas de setembro e outubro, também é vista como oportunidade. “A qualidade comprometida inviabiliza o uso do trigo para panificação”, diz Bento.
O presidente da Comissão de Trigo da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) e da Câmara Setorial do Trigo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Hamilton Jardim, destaca que o cenário deve colocar a produção gaúcha em destaque, principalmente pela procura de moinhos paranaenses. “Não sei nem se as exportações gaúchas vão chegar ao volume previsto de quase 3 milhões de toneladas, como foi no ano passado”, pontua. Segundo ele, a possibilidade de a comercialização interna estar favorável é grande, embora o cenário ainda seja de incógnita. “O forte da colheita é em novembro. Tomara que o clima não atrapalhe”, projeta.
Jardim defende que o trigo seja comercializado com cautela durante toda a próxima safra para que o triticultor possa aproveitar os melhores preços, e não somente por ocasião da colheita. “Acredito que, na virada do semestre, os preços estarão ótimos e bem mais atraentes que hoje”, projeta, citando também os problemas de produtividade causados pela chuva no Paraguai, geograficamente próximo do Paraná.
Cenário global influencia comercialização
Na última semana, a tonelada do trigo gaúcho foi comercializada pela média de R$ 1,65 mil aos moinhos do Estado, enquanto chegou a R$ 1,85 mil para exportação. “Com menos R$ 100,00 do frete, o produtor ficou em R$ 1,75 mil”, relata o consultor Élcio Bento. Ele lembra que a Argentina é uma importante formadora de preços para o trigo brasileiro, mas com base no mercado internacional. Por esse motivo, alerta que a curva de preços durante a comercialização da safra 2022 pode também não ser favorável ao produtor. “O país está inserido em um contexto global, ou seja, mesmo com safra menor, se tiver de baixar os preços para competir lá fora, irá baixar”, assegura.
“Temos uma situação global complicada. Ucrânia talvez não consiga vender. Há projeção de um corte grande na produção norte-americana. O trigo do Mercosul entra aqui sem taxação, mas se faltar, teremos de comprar de fora. Há produção na Rússia, que está com uma super safra, mas irá entrar no Brasil com preços elevados”, finaliza.
Fonte: Correio do Povo