Comportamento

Sindicato dos atores dos EUA põe limites à IA em seu acordo após greve

Paralisação de quase quatro meses foi encerrada com acordo

(Foto: MARIO TAMA / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP)
(Foto: MARIO TAMA / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP)

Desde figurantes gerados por computador até “zumbis” virtuais: o sindicato americano dos atores estabeleceu novas restrições contra o uso da Inteligência Artificial (IA) em Hollywood.

O Sindicato dos Atores de Hollywood (SAG-AFTRA, na sigla em inglês) chegou esta semana a um acordo com estúdios como Disney e Netflix para encerrar sua greve de quase quatro meses. Em torno de 86% dos membros de sua junta diretora votou a favor da ratificação do acordo.

Além de um aumento salarial mínimo de 7% e de um novo fundo de US$ 40 milhões anuais (R$ 196,8 milhões na cotação atual) para transferir uma parte da receita das séries de sucesso dos estúdios para os atores, um elemento-chave das negociações foram as barreiras ao uso da IA.

O acordo “permite à indústria seguir adiante, não bloquear a IA”, declarou Duncan Crabtree-Ireland, negociador do SAG-AFTRA, em entrevista coletiva.

“Mas garante a proteção dos artistas. Seus direitos ao consentimento estão protegidos. Seus direitos a uma compensação justa e seus direitos trabalhistas estão protegidos”, afirmou.

Os estúdios vêm experimentando a IA nos últimos anos, seja trazendo de volta estrelas de cinema falecidas, com o uso de “réplicas digitais” realistas, seja criando figurantes gerados por computador para reduzir o número de atores necessários para as cenas de batalha.

Muitos produtores que reduzem os custos querem que a IA desempenhe um papel cada vez mais importante e começaram a exigir que alguns atores participem de “escaneamentos corporais” 3D de alta tecnologia no “set”, muitas vezes sem explicar como, ou quando, as imagens serão usadas.

Agora, um ator deve receber por qualquer uso de sua réplica digital a mesma remuneração que receberia se fizesse a mesma “quantidade de trabalho” em cena na vida real, disse Crabtree-Ireland.

Ante o temor de que os figurantes sejam os primeiros a perderem seu trabalho por causa da IA, restrições rigorosas foram impostas.

“Uma réplica digital não pode ser usada para burlar a contratação e o pagamento de um ator coadjuvante sob este contrato”, acrescentou Crabtree-Ireland.

Os estúdios devem obter o consentimento de um ator – ou de seus herdeiros – sempre que usarem sua réplica digital em um filme, ou em um episódio de televisão. Tampouco poderão apresentar aos atores contratos padrão que os autorize a usar uma réplica indefinidamente, devendo, em vez disso, fornecer uma “descrição razoavelmente específica” de como ela será usada a cada vez.

‘Zumbis’

A tecnologia de IA avança a um ritmo vertiginoso, mas nunca antes havia feito parte das discussões de renegociação de contratos do SAG-AFTRA com os estúdios que acontecem a cada três anos, aproximadamente.

A presidente do SAG-AFTRA, Fran Drescher, disse que era vital instituir as normas desta vez, porque, “no mundo da IA, três meses equivalem a um ano”.

“Então, se não conseguíssemos essas barricadas, o que seria daqui a três anos? Estaria tão fora do nosso alcance, que sempre estaríamos perseguindo algo, mas nunca acabaríamos conseguindo”, explicou.

O último e polêmico detalhe a ser discutido com os estúdios na noite de terça-feira dizia respeito ao uso de IA para criar ‘falsos atores sintéticos”. Chamados pela revista especializada “Variety” de “zumbis”, ou “Frankensteins digitais”, eles são construídos de diferentes partes do corpo de atores reais.

“Se você usar o sorriso do Brad Pitt e os olhos da Jennifer Aniston, ambos têm o direito de dar seu consentimento”, explicou Crabtree-Ireland à revista.

Na entrevista coletiva de sexta-feira, ele disse que os estúdios agora são obrigados a obter permissão de todos os atores cujos traços sejam utilizados. Também deverão informar o SAG-AFTRA sempre que um “falso ator sintético” for criado. O sindicato terá o direito de negociar uma compensação em nome dos atores envolvidos.

‘Fator decisivo’

Drescher disse que a IA foi um “fator decisivo” nas negociações e que as proteções não ajudarão apenas os atores, mas também muitas outras profissões na indústria do entretenimento.

“Em um mundo sintético, você não precisa de cabeleireiros, ou de maquiadores. Não precisa de motoristas. Não precisa de cenógrafos”, explicou.

“Por isso, para nós, continuar esperando o melhor pacote de IA possível também teria impacto no futuro deles”, completou.

Crabtree-Ireland instou os políticos a fazerem mais para “tornar a proteção da IA uma prioridade”.

“Nossos membros defenderão os esforços legislativos e continuarão participando ativamente do movimento para proteger os direitos de todas as pessoas sobre sua imagem”, frisou.

Fonte: Correio do Povo