Comportamento

Saiba como denunciar uma obra irregular em Bento Gonçalves

É fácil perceber quando uma obra está acontecendo, mas como proceder quando os problemas ultrapassam transtornos comuns como barulho e sujeira? O assunto é delicado, e muitas pessoas não sabem como denunciar uma obra irregular

Saiba como denunciar uma obra irregular em Bento Gonçalves

Todo mundo sabe que uma construção irregular causa muitos transtornos. Seja feita por um vizinho, uma construtora ou até mesmo pelo poder público. Além do barulho e dos problemas que podem gerar em diversas áreas, as obras irregulares podem identificar uma simples ausência de licença até danos na infraestrutura que, em casos extremos, podem resultar até mesmo em desabamentos e mortes. Mas você sabe o que fazer para identificar essas irregularidades, evitar tantos riscos e, quando for o caso, denunciar aos órgãos competentes? Segue o fio.

A primeira coisa a fazer é saber se a obra está devidamente registrada e autorizada. Para isso é preciso verificar inicialmente se a obra tem uma placa de identificação, que devem ser mantidas no local desde o início até o término da obra e conter o nome do responsável técnico e suas credenciais, o número do alvará emitido pela prefeitura e o termo de responsabilidade técnica (TRT) na execução de obras e na prestação de serviços de técnicos industriais.

A diretora do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (Ipurb) de Bento Gonçalves, Melissa Bertoletti Gauer, aponta que a irregularidade mais comum é a falta de aprovação do projeto, o que pode ser regularizado com relativa facilidade. “A irregularidade mais constatada é obra sem projeto aprovado”, afirma a diretora do Instituto, que alerta para que a situação não fuja do controle e ganhe a esfera judicial, por exemplo.

Outra dica importante é tentar identificar o impacto da obra em questão. Reformas ou construções em grande escala precisam contar com alvará da prefeitura e um profissional responsável pelo trabalho, além de uma placa de identificação. Se a obra for de grande escala e não contar com essa placa, não restam dúvidas: você encontrou uma construção irregular.

Depois dessa verificação, é preciso identificar qual o tipo de irregularidade pode estar sendo cometida. Neste aspecto, é preciso verificar se a empresa possui registro no conselho e se apresenta um responsável técnico, se há exercício ilegal da profissão, se a obra está sendo realizada sem acompanhamento técnico, se falta o Termo de Responsabilidade Técnica, ou se há infrações éticas ou contra a legislação, por exemplo.

Segundo especialistas, reformas e mudanças de projeto precisam passar por rigorosa avaliação de um engenheiro ou arquiteto antes saírem do papel. Alterações nas plantas originais, como por exemplo, a simples retirada de uma parede, podem provocar danos à estrutura da obra e, em casos extremos, causar até a queda da edificação. Ao ser flagrada com uma obra irregular, o responsável ou o proprietário podem receber uma multa que varia de acordo com o tamanho da obra, e o trabalho é imediatamente embargado até que a situação apontada seja regularizada.

Conforme advogados consultados pela reportagem, há casos em que somente os técnicos encarregados da fiscalização poderão identificar a irregularidade, como, por exemplo, se os trabalhadores estão registrados, se os direitos trabalhistas estão sendo observados ou aqueles referentes aos equipamentos de segurança. Contudo, existem casos em que a irregularidade é mais fácil de ser identificada, como a falta de tapumes no canteiro de obras, a falta de placa com a indicação do responsável e outros problemas ligados à identificação.

Um dos problemas mais graves diz respeito às escavações das obras para abrigar a parte da construção que fica no subsolo. “Com o escavo surge o risco de desmoronamento, com perigo não só aos trabalhadores da obra, bem como aos prédios e habitantes da vizinhança. Outro problema é com as detonações para remover o solo rochoso. Nesse caso, não basta que o responsável pelas detonações da rocha esteja licenciado para operar com explosivos, sendo bastante comum as detonações causarem danos aos prédios vizinhos, como rachaduras e até risco de desabamento”, afirma o advogado Luiz Mello.

A fiscalização

Em Bento Gonçalves, a prefeitura destina ao Ipurb a tarefa de fiscalização de rotina na cidade. Mas é preciso lembrar que essa fiscalização só acontece a partir de uma denúncia, que pode ser feita através do número 08009796866. Nestes casos, os fiscais vistoriam a obra e podem exigir a regularização da documentação, indicando que as alterações ou a própria construção foram projetadas por engenheiros e minimizam os riscos de as intervenções comprometerem a estrutura da construção.

Em Bento, a tarefa de fiscalizar o andamento de obras é do Ipurb

Conforme Melissa Gauer, caso alguma irregularidade seja identificada, os fiscais realizam uma notificação, que abre um prazo para a regularização. Se nada for feito, será emitido um auto de infração e, posteriormente, o responsável pela obra irregular terá de pagar uma multa. O Procurador-Geral do Município, Sidgrei Spassini, acrescenta que a procuradoria adota as medidas judiciais cabíveis após a finalização dos processos administrativos realizado pelo Ipurb.

Se as irregularidades permanecerem, a obra pode ser embargada. Para isso, basta que a fiscalização encontre algo fora dos trâmites legais, seja no projeto ou na licença da prefeitura. O embargo é uma medida acionada para paralisar as obras em qualquer construção civil, seja montagem, manutenção, instalação ou reforma. A partir do momento que a fiscalização embarga uma construção, a prefeitura dá 30 dias para que os responsáveis regularizem a situação, seja com uma nova licença ou uma defesa de aprovação do projeto.

Caso todo esse processo não apresente resultados, uma medida mais grave é a interdição da obra. Enquanto o embargo acontece mediante a falta de uma licença, a interdição é um pouco mais extrema, e pode ser tomada quando há uma clara ameaça à segurança dos trabalhadores e das pessoas nos arredores, por exemplo, ou quando as irregularidades são insanáveis. A interdição ocorre de forma semelhante ao embargo, com fiscalização dos órgãos, auditores-fiscais do Trabalho, pela Defesa Civil ou por decisão judicial. Nesses casos, os danos podem ir além de um simples atraso e multa.

A diretora do Ipurb afirma que geralmente as pessoas só se dão conta da situação quando há aplicação de multa. “Aí não tem mais o que fazer, tem que pagar a multa. Porém, pagar a multa não quer dizer que a obra está regularizada”, alerta, indicando que, mesmo com o pagamento, é preciso entrar com processo solicitando a regularização da obra. Caso a multa não seja quitada, a situação pode evoluir até para a abertura de processo judicial.

Como fazer a denúncia

Mello afirma que o primeiro fiscal é sempre o vizinho da obra que, ao primeiro sinal de alguma interferência, deve apresentar uma reclamação. A sugestão que ele aconselha é procurar o responsável pela obra e, na hipótese de que não sejam tomadas providências, o caso seja levado ao conhecimento das autoridades. “É importante destacar que, mesmo em caso da obra estar legalizada, não significa que o responsável possa fazer o que bem entende para levar a construção adiante”, reflete o advogado. “Caso seja constatado que a obra, mesmo estando legalizada, está criando um risco à segurança ou algum dano ambiental, a licença pode ser suspensa ou cassada, até que a irregularidade seja sanada”, afirma.

Os advogados insistem que, quando uma pessoa tem certeza de que a construção é irregular, denunciar a obra é quase uma obrigação. Afinal, em alguns casos, essas reformas podem inclusive colocar em risco à segurança das pessoas que passam pela área. Qualquer pessoa, seja ela Física ou Jurídica, pode fazer uma denúncia no conselho contra um profissional, empresa ou instituição prestadora de serviços técnicos; na prefeitura, a partir da constatação de irregularidades na obra e ao MP.

Em Bento Gonçalves, a denúncia deve ser encaminhada ao Ipurb, através de um telefone de plantão, 08009796866. É possível fazer uma denúncia anônima. Outra medida indicada para denunciar obra irregular é por meio judicial. Se as irregularidades forem constatadas, a obra será paralisada até que o mérito da ação seja julgado.

É importante destacar que essa providência só pode ser tomada quando a obra ainda estiver em execução, e nunca depois de finalizada. Em casos mais urgentes, é possível ainda denunciar a obra através de um embargo extrajudicial. Neste caso, o proprietário é notificado a suspender sua obra na presença de testemunhas. Em seguida, o ato é verificado por um juiz no prazo de três dias. Entretanto, é importante destacar que qualquer providência que envolva a justiça deve ser feita com a ajuda de um advogado especializado no setor.

No site do Ministerio Publico, há um formulário online para recebimento da denúncia. Uma vez formulada, a investigação seguirá seu curso, independentemente de qualquer ato do denunciante, e não será possível “desistir” ou “retirar” a denúncia. O denunciante poderá solicitar o sigilo de seus dados de identificação pessoal de forma fundamentada. O pedido será analisado pela autoridade responsável pela apuração da denúncia, que poderá deferir ou não a solicitação. Uma vez deferido o sigilo, este persistirá até a conclusão da apuração. O sigilo deferido se aplica a todos, exceto ao denunciado e ao seu advogado, que poderão ter acesso integral ao processo.

Mas quem denuncia pode optar conscientemente por não se identificar, bastando não preencher esses dados. Assim, a denúncia será tratada como anônima. Neste caso, o denunciante não receberá qualquer informação quanto ao andamento da denúncia. Este formulário será obrigatoriamente arquivado e, somente se houver indícios suficientes para instauração de procedimento investigatório preliminar, a autoridade poderá instaurar por iniciativa própria um novo procedimento para apuração dos indícios.

É preciso ter em mente que, enquanto alguns órgãos públicos agem mediante simples comunicação, outros dependem de provocação. Por exemplo, a fiscalização pelo Ipurb e pelo Ministério do Trabalho ocorre pela simples comunicação de qualquer interessado, enquanto para o Judiciário é necessária a apresentação do pedido através de uma ação judicial, com a presença de um advogado.

A intervenção do cidadão também pode ocorrer em níveis mais complexos, como na proteção ao meio ambiente, preservação de espécies nativas e do patrimônio histórico. Nesses casos, é comum que a obra esteja licenciada, mas, no seu andamento, algum interesse público relevante, e que não tenha sido analisado pela autoridade que concedeu o alvará, pode aparecer, como a presença de nascentes de água ou risco para a preservação de espécies nativas da fauna e da flora, o que exige que o problema seja apontado à autoridade para que a outorga da licença seja revisada. “Como se pode ver o conflito de interesses pode ocorre em diversos níveis, desde o conflito de direitos de vizinhança até interesses de maior impacto social ou econômico. Mas é importante destacar que a dimensão do conflito não retira o direito do cidadão de reclamar e de pedir providências às autoridades”, garante Mello.