Opinião

O fetiche da tributação sobre dividendos

O fetiche da tributação sobre dividendos

O texto apresentado pelo Governo Federal nada tem de reforma. É apenas um texto que aumenta a tributação pelo Imposto de Renda e torna mais complexo o sistema tributário brasileiro (sim, é possível ser mais complexo ainda).

Um ponto chama a atenção: a insistência em pretender tributar os dividendos. Há tempo o Governo sugere a tributação dos dividendos. A análise deveria ser feita de forma técnica. Porém não é isso que está ocorrendo.

O argumento reiterado favorável à tributação de dividendos é o fato de que o Brasil é um dos únicos países que não os tributa.

Mas isso, a rigor, é um argumento vazio. Ou que é utilizado apenas para esconder o real objetivo da pretendida tributação. Afinal, ao comparar o Brasil com realidades tributárias diferentes se está comparando bananas com maçãs.

Dividendos são parte do lucro das empresas que são distribuídos para seus acionistas e sócios. Há mais de 25 anos o Brasil optou a não tributar os dividendos, para centralizar a tributação na empresa.

O raciocínio é singelo, e de forma simplificada é assim: da receita que a empresa recebe são deduzidos todos os seus custos (folha de salários, fornecedores, etc.) e o que sobra é o lucro. Sobre esse lucro ocorrerá a incidência do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica.

A empresa pode reinvestir o lucro na própria empresa ou distribui-lo por meio de dividendos.

Vejam que a renda originária é a mesma – o lucro que fica na empresa depois e descontados os seus custos. Os países têm duas opções: Tributar apenas na empresa e isentar a distribuição de dividendos, ou tributar nas duas pontas – a empresa e os dividendos. Mas essa opção não irá mudar o fato de que a única grandeza que está sendo tributada é, na origem, a mesma.

Portanto, só faria sentido passarmos a tributar os dividendos, se a tributação da empresa fosse reduzida, senão o que vai ocorrer é o aumento da tributação total.

Mas o ponto central é outro: Mesmo que se conseguisse fazer exatamente a matemática (há diferentes regimes de tributação) e reduzir a tributação da empresa aumentando a dos dividendos para que se atingisse a mesma tributação que atualmente ocorre, ainda assim seria prejudicial.

E por quê? Pois se agrega complexidade ao sistema.

E complexidade gera custo para o contribuinte, que terá que gastar mais com custos para cumprir as obrigações tributárias (em um caso previsto no projeto o contribuinte todo o mês deverá gerar uma DARF e realizar o pagamento).

E gera custo para o Estado que terá maior custo com fiscalização. Tanto que as regras de distribuição disfarçada de lucros foram modificadas.

Ou seja, no final, além de haver maior complexidade, o Estado gastará mais para fiscalizar (pessoal, poder computacional, tempo, etc.) e assim, se a tributação ficar a mesma, ela não servirá para cobrir os novos gastos. Resultado: terá que haver aumento de tributação.

Em outras palavras, mesmo se o Estado aumentar a tributação (o que ele alega não querer fazer) o aumento pode ter que ser direcionado para fiscalizar a própria complexidade criada com a modificação da regra.

A escolha do Brasil em tributar a renda apenas na empresa traz simplicidade a essa parte do sistema, e a sua mudança agora não faz o menor sentido. Pode chegar em um resultado indesejado para todos – aumenta a tributação para o indivíduo, e a arrecadação gerada será absorvida para fiscalizar essa própria atividade arrecadatória. O Estado não ganhará efetivamente nada.

A menos que aumente substancialmente a tributação total, que é o que ele alega não estar fazendo.

Não há explicação para se insistir nessa lógica. Ou é puro e simples aumento de tributo. Ou é fetiche.