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Mesmo que não vá rolar

Mesmo que não vá rolar

 

Nesses dias em que ganhou voz a campanha das atrizes americanas contra o assédio sexual e que a resposta francesa sobre a liberdade de importunar a mulher pegou mal, a gente ficou sabendo que por aqui pelo menos seis mulheres a cada dia são agredidas ou ameaçadas por homens. E geralmente homens que fazem parte de suas vidas, que desfrutam de suas intimidades.

Pior que isso, a gente também ficou sabendo que, na contramão das estatísticas do estado, o número de estupros em Caxias do Sul cresceu 44% entre 2016 e o ano passado.

E enquanto a gente acha positivo que mais mulheres tenham a coragem de não calar e de denunciar a agressão, a gente fica também estarrecido, porque sabe que do assédio ao estupro isso ainda acontece todo dia cada vez mais perto de casa.

E é nesse contexto histórico de abuso, de segregação e de violência que a gente precisa entender de uma vez por todas que é preciso mudar as mentalidades pra entender os caminhos tortuosos que separam a sedução e a paquera do assédio e do abuso que levam ao estupro.

Porque o assédio pode assumir formas sutis, elogios, cantadas inocentes, até o toque quase involuntário e aquele tapinha despretensioso, cercado de uma intimidade aparente que também pode esconder a agressão.

E porque o problema do assédio é cultural e histórico, e ele fica bem claro quando a gente nem consegue identificar o constrangimento ou até mesmo a própria violência, numa sociedade amadurecida no machismo, onde os homens acham que podem fazer o que querem com as mulheres, acreditam que os corpos delas são públicos e que a cantada, qualquer cantada, é a coisa mais natural do mundo.

E olha que eu não estou dizendo aqui que a cantada tá proibida e que não pode mais paquerar nem elogiar. Não é isso. O que é preciso é entender que há limites, e é preciso compreender definitivamente que quem define esse limite é a mulher. Simples assim.

Então o que eu estou dizendo aqui pra você é que quem define se o tapinha dói ou não é a mulher, quem decide se o limite foi ultrapassado é a mulher, e ponto final. E é assim mesmo que deve ser.

Pra que um dia a gente não reclame do crescimento dessa estatística e pra quem sabe chegue o dia em que a gente não precise mais de campanhas e que a violência seja a exceção sempre punida.

Porque a mulher, cara-pálida, não veio ao mundo pra satisfazer os desejos masculinos, porque a violência não é a sedução aumentada e porque pra seduzir não precisa ser insistente, não precisa tocar e, principalmente, porque pra seduzir é preciso encantar, entender e respeitar.

Mesmo que não vá rolar. Sacou?