A Comissão Intra-hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes (CIHDOTT) do Hospital Tacchini captou recentemente três doações de múltiplos órgãos, sendo que a retirada ocorreu dentro da estrutura do bloco cirúrgico da Instituição, com o apoio da equipe da Central de Transplantes do Estado. Nas captações, foram retirados o coração, o fígado, rins e córneas.
O trabalho da CIHDOTT, porém, vai muito além da captação de órgãos. A equipe seguidamente realiza trabalhos de conscientização e sensibilização junto à comunidade para obter um resultado positivo na captação e, principalmente transmitir aos familiares que o ato da doação vai muito além de salvar vidas. É uma atitude que muda o quadro de uma família inteira que vive a angústia da espera e na expectativa pela mudança. “A cada abordagem enfrentamos situações diferentes e tudo acontece no momento mais delicado das famílias, ou seja, quando perdem um ente querido. Precisamos agir de forma humanizada e acolhedora, apresentar nosso propósito e esclarecer que o gesto praticado é algo nobre”, explica a enfermeira Ana Maria Turmina, coordenadora da CIHDOTT. Ela relata que o trabalho é orientado pela Central de Transplante do Estado e realizado por ambas as equipes, compostas por multiprofissionais. “Neste momento toda a equipe é acionada. Literalmente corremos contra o tempo para que nenhum órgão captado seja perdido”, relata.
Somente em 2019, a CIHDOTT já captou 60 córneas, 4 rins, 3 fígados e um coração. No Hospital Tacchini a comissão é formada por 23 profissionais de diferentes áreas. Todos os órgãos captados são enviados para a Central de Transplantes, órgão que controla e regula a fila de espera no Estado. As córneas são encaminhadas ao Banco de Olhos do Hospital Geral, em Caxias do Sul e o tecido músculo esquelético vai para o Banco de Ossos do Hospital São Vicente de Paulo, em Passo Fundo.
GESTO NOBRE
Por mais que esse tema seja falado nas famílias ou nas rodas de amizade, decidir sobre doação de órgãos é algo que cabe exclusivamente aos familiares e isso, necessariamente, ocorre no momento mais difícil, ou seja, na perda do familiar. Os relatos a seguir são de familiares que passaram recentemente por esta experiência e nunca tinham falado sobre este tema, mas que decidiram realizar a doação por entender que se tratava de um gesto nobre e que, certamente, iria ao encontro do perfil dos doadores, que em vida sempre primaram por fazer o bem, sem saber a quem.
Há pouco mais de um mês, a bancária Juliana Pieniz dos Santos viu a vida de sua família mudar repentinamente. Moradora de Porto Alegre, ela estava a passeio em Bento Gonçalves, quando sua mãe sofreu um AVC hemorrágico e, dias depois, foi diagnosticada com morte encefálica. “Em um dos momentos mais difíceis da minha vida, me deparei com uma decisão que seria muito mais minha do que qualquer pessoa: doar os órgãos da minha mãe. Nunca havíamos falado sobre isso a ponto de saber sua vontade. Mas estávamos cientes de que, em vida, ela sempre fez por todos e era muito prestativa e solidária”, conta Juliana. Diante disso, a família não pensou duas vezes e a resposta foi ‘sim’. “É uma forma de saber que assim ela está viva e continua fazendo o bem. Hoje sei que seus olhos são a visão de alguém. Parte de si foi a segunda chance para alguém que ainda não cumpriu seu destino neste plano”, conforta-se. Após a doação de órgãos, a família recebeu uma carta da Central de Doação de Órgãos do Estado. “Com certeza fizemos algo que fez muito bem para alguém. Onde ela estiver, continua orgulhosa da nossa força e da nossa fé!”, declara.
Empatia, ou seja, a capacidade de se colocar no lugar do outro. Foi isso o que motivou os familiares da professora Ivete Domann Rener a doarem seus órgãos, mesmo que o tema não tenha sido tratado em vida. A irmã dela, Isalete Maria Domann, conta que no momento da decisão, a família lembrou das pessoas que estão doentes, esperando por um órgão para continuar a viver. “E se a Ivete tivesse morrendo por outro motivo? Se ela estivesse precisando de um coração? Com certeza, ficaríamos muito gratos e iríamos muito querer ganhar um coração para salvar a vida dela”, questiona, lembrando que Ivete era uma pessoa muito boa e gostava de ajudar as pessoas. “Tão boa que o tipo de morte que teve foi possível salvar a vida de 6 pessoas”, lembra Isalete. A família tem informações que nenhum dos órgãos doados (coração, rins, fígado e córneas) sofreu rejeição por parte das pessoas transplantadas. “Ela nos deixou uma grande lição de vida. Hoje, nosso maior conforto seria um dia poder conhecer estas pessoas que receberam os órgãos dela. Mas temos a certeza que muitas vidas recomeçaram”, conclui Isalete.