Eu abasteci

Fatos estranhos vem acontecendo no país desde que os caminhoneiros resolveram parar. Mais do que fatos, notícias e interpretações para lá de ecléticas, todas definitivas.

Estava eu esta manhã na fila de um posto de gasolina. Passaram-se dez dias e achei que o meu “civismo” tinha dado sua contribuição à categoria e ao povo brasileiro. Também penso que o diesel está caro, a gasolina está cara e os governantes são muito caros e ineficientes.

Antes da paralisação não pensei que as coisas fossem chegar ao ponto que chegaram. Agora temos esta avalanche de notícias e de contínua insatisfação. Pelo sim, pelo não, quem garante que haverá normalidade na próxima semana. Já se discute que a redução no preço do diesel será de 41 centavos, cinco a menos do que o prometido. É assim, sempre se acha algum entrave e quem paga é o povo que não tem um bom latim na ponta da língua pra arrumar desculpa ou fugir dos impostos.

Não parece haver consenso a não ser o de que somos governados por desgovernos. Mas nem quero ir tão longe. Gostaria de saber qual é o “lado certo” – se é que existe – quando motoristas aflitos enfrentam horas de fila para colocar um pouco de combustível e outros cidadãos fazem uma corrente impedindo o abastecimento. Invocam um espírito cívico, estão inflamados pelo protesto dos caminhoneiros, já não se conformam com o estado das coisas.

Mas e se o cara que vê, na chance de abastecer, a possibilidade de tentar por um pouco de normalidade no seu dia a dia, de ir visitar a filha ou a mãe que mora na cidade vizinha; de entregar aquela mercadoria encomendada e pegar o tão desejado cheque de pagamento. Olha, as necessidades diárias de cada pessoas são tão diferentes e a importância que damos às coisas, por menores que sejam, tão desiguais.

Enfim, como diz o popular, cada um sabe onde aperta o sapato. São questões tão individuais que não cabe aos outros julgar. Ademais, me parece que alguns dos que hoje se dizem patriotas, e trancaram postos trocaram voto por 20 litros de gasolina. Alguém duvida?

Então se eu decido que é importante ter combustível no tanque pelo dobro do preço isso me torna menos cidadão do que aquele que me impede de abastecer por acreditar numa causa maior?

De certa forma invejo estes idealistas. Já fui a passeatas, já cantei hino por diretas, já bati… não, não bati panelas, não há porque mentir. A verdade é que ando desiludido sobre certas “causas maiores”. Penso mesmo é que na conduta pessoal mudamos muita coisa e podemos dar a nossa contribuição, embora é preciso reconhecer que as mobilizações causam impacto e têm sim o poder da mudança.

O que me preocupa é o imediatismo. Nos mobilizamos hoje e esquecemos tudo na semana que vem. Aí não dá.