Opinião

Empreendedor: será que é só isso?

Empreendedor: será que é só isso?

Depois de longos 20 anos o Supremo Tribunal Federal decidiu definitivamente sobre a tributação do software. O julgamento iniciou em uma era longínqua. Pré-smartphones, pré-linkedin, pré-instagram, pré-home broker, e, acreditem, pré-VAR.

Foi definido que a venda de licenças de software, e a sua própria confecção, se equipara a serviços e não a de mercadorias físicas. E, portanto, o tributo que incide é o Imposto Sobre Serviços (ISS), de competência municipal, cujas alíquotas variam de 2% a 5%.

Caso fosse equiparado à venda de mercadorias, a tributação seria por meio do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS), de competência estadual, com alíquotas nominais médias de 18%.

Até hoje, o posicionamento do STF sobre softwares os diferenciava de acordo com o tipo. Softwares considerados standard, conhecidos como “de prateleira”, eram equiparados a mercadorias, e sofriam a tributação pelo ICMS. É o caso do pacote office, Windows, etc.

Por outro lado, quando os softwares eram feitos sob encomenda, sofriam incidência do ISS, pois se entendia que neles havia uma prestação de serviço. São os softwares customizados, que são todos aqueles encomendados especificamente para as finalidades da linha de produção, por exemplo.

No meio do caminho surgiram os softwares customizáveis, que, embora tenham uma plataforma comum, podem ser adaptados para as necessidades específicas dos seus compradores. Esses também, em regra, se equiparavam a serviços.

O STF passou uma régua em tudo isso e definiu que incide ISS para qualquer tipo. Isso traz segurança jurídica para todos.

Mas será que é só isso?

Em tributário é muito importante se ter uma visão geral de todos os impactos que as novas leis, decretos e decisões trazem para o sistema.

No caso dos softwares, a solução foi dada apenas em relação a tributação sobre a venda (ISS em vez de ICMS). Mas é importante notar que a Receita Federal utiliza até hoje aquela mesma dicotomia (softwares standard Vs customizado) para alguns tributos federais.

Por exemplo, empresas sujeitas ao regime de apuração do Imposto de Renda pelo lucro presumido, em regra, se forem prestadoras de serviço, a base de cálculo é 8% de sua receita. Ao passo que se estiverem no varejo, a presunção da base de cálculo é 32% de sua receita.

Atualmente poderá haver modificação nesse entendimento. Ou seja, todas as empresas que revendem software standard e recolhem IR pelo lucro presumido terão um aumento considerável de tributação. Antes, a base de cálculo do IR era 8%, agora é 32% da sua receita.

Outro caso é a Contribuição Previdenciária Patronal (INSS). Há a lei da desoneração da folha, que permitiu alguns setores da economia a substituírem o recolhimento da contribuição ao INSS pelo recolhimento da Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta (CPRB). E eles assim o fazem. Para o setor de softwares, somente os serviços vinculados até agora podiam fazer essa escolha, e então as vendas de softwares standards não poderiam fazer essa opção, já que equiparadas a mercadorias.

Agora, todos poderão. E é sempre bom poder ter a opção de qual tributo recolher, já que se pode optar pelo mais econômico.

Obviamente, esses reflexos nos tributos federias ainda não foram formalmente aceitos nem pela Receita Federal, nem pelo STF, já que o julgamento mencionado não tratou especificamente sobre isso. Seria estranho, entretanto, o STF entender que para um determinado tributo o software é serviço, e para outro, mercadoria.

Mas claro, essas medidas dependem de análise cuidadosa e, eventualmente, o ingresso na Justiça.

Esse exemplo ilustra o que ocorre muito em tributário. Uma decisão relativamente a um tributo pode ter reflexos em outros. Vários outros.

Por isso a operação da empresa deve sempre ser analisada de forma global, sob pena de se perder oportunidades, ou até de se estar criando um passivo oculto.

O empresário, que já tem todos os tipos de preocupações com o dia a dia, tem que estar sempre de olho em tudo:, no seu Iphone, na bolsa de valores, no Linkedin, e, até no VAR.