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Deputados pedem mais tempo ao governo do RS para debater a privatização da Corsan

Os parlamentares indicam que a urgência da privatização, impede esclarecimentos

Deputados pedem mais tempo ao governo do RS para debater a privatização da Corsan
Com os projetos de regularização e privatização da Corsan na Ordem do Dia da sessão plenária da próxima terça-feira (31), em regime de urgência, a Comissão de Finanças promoveu audiência pública para exposição das matérias pelos gestores do governo e, também, para o contraponto de grupo de parlamentares que consideram o prazo para discussão insuficiente, assim como prefeitos apontam insegurança jurídica na futura composição da companhia de saneamento. Pairam dúvidas, também, sobre a proposta encaminhada esta semana pelo presidente da ALRS, deputado Gabriel Souza (MDB), sobre o tema. O debate foi em formato virtual, na noite de quinta-feira (26), coordenado pelo autor do pedido de audiência, deputado Mateus Wesp (PSDB).
Com a presença do chefe da Casa Civil, Artur Lemos, e do presidente da Corsan, Roberto Barbuti, ao lado do secretário do Meio Ambiente e Infraestrutura, deputado Luís Henrique Viana (PSDB), o que não aconteceu em audiência anterior para tratar do assunto, Mateus Wesp encaminhou o debate do PL 210/2021, que cria a Unidade Regional de Saneamento Básico Central – URSB Central, e do PL 211/2021, que autoriza o Executivo a desestatizar a Companhia Rio-grandense de Saneamento – CORSAN. Os deputados Faisal Karam (PSDB), Tiago Simon (MDB), Jeferson Fernandes (PT), Frederico Antunes (PP), líder do governo, Luiz Fernando Mainardi, Pepe Vargas e Fernando Marroni, do PT, assim como prefeitos, Famurs, Sindiágua e servidores da companhia também participaram da discussão.
Nos encaminhamentos, Wesp anunciou o pedido de urgência ao governo do envio à comissão de documentos solicitados pelos deputados Pepe Vargas (PT) e Tiago Simon (MDB), que tratam do plano de investimentos da Corsan e de estudo do BNDES, assim como a proposta original encaminhada esta semana pelo presidente da Assembleia, deputado Gabriel Souza (MDB).
A movimentação do governador Eduardo Leite para aplicar as mudanças na companhia atendem às exigência do Marco Legal do Saneamento Básico, lei federal sancionada ano passado e que prevê até 2033 o prazo para que estados e municípios promovam o acesso de água potável para 100% da população e de 90% do tratamento de esgoto no país. A lei abre as atuais companhias estaduais para investimentos da iniciativa privada, o que exige a desestatização das empresas. Tanto o chefe da Casa Civil, Artur Lemos, quanto o presidente da Corsan, Roberto Barbuti, foram categóricos em assegurar que todos os procedimentos estão em conformidade com as modelagens do mercado para esses processos, afastaram riscos jurídicos apontados pelos prefeitos, com garantias da Procuradoria-Geral do Estado, e que a privatização da Corsan pode ocorrer mesmo sem a aprovação da regionalização, que é exigência do Marco Legal do Saneamento para continuar com o subsídio cruzado, temos dos prefeitos de que não se concretize nos 307 municípios cujos contratos estão nessa condição. Lemos alertou, inclusive, que “o município não regionalizado não poderá acessar recursos públicos para a área de saneamento”, uma das justificativas da opção do governo pela privatização, assegurou o chefe da Casa Civil.
Na sua exposição, o presidente da Corsan, Roberto Barbuti, assegurou que todas as medidas foram adotadas para dar segurança às mudanças na companhia. Disse que o plano de investimentos, questionado pelo prefeito de Palmeira das Missões, será acessado pelos gestores municipais, uma vez que é a origem da previsão de R$ 1 bilhão para investimento. Defendeu a viabilidade do plano, que exigia mudanças “incompatíveis com a natureza estatal da Corsan”. Garantiu que o subsídio cruzado continua, que é a modalidade atual que permite amparar os municípios que não alcançam suas metas. “Estamos trabalhando para ter os aditivos, com respaldo jurídico da PGE, e convencer os prefeitos que isso será o melhor para eles”, afirmou. Outro esclarecimento foi de que o estado, ao permanecer com 30% da Corsan, passa à condição de acionista de referência, não sendo mais controlador.
Barbuti desmentiu as versões de que a Corsan teria capacidade para enfrentar as novas regras do Marco Legal, referindo casos de desabastecimento em Gramado, Gravataí, Cachoeirinha e Santa Cruz do Sul entre 2019 e 2020. E assegurou que a empresa pratica a tarifa mais alta do país. Disse, ainda, que foi através das PPPs que a Corsan atingiu a universalização antes do previsto pelo Marco Legal, tanto que algumas obras estão sendo antecipadas. Elogiou a qualificação dos servidores da Corsan, que serão a base para a aplicação da modelagem proposta. E previu a transformação da companhia em referência nacional em saneamento, atuando em novas áreas, como resíduos sólidos, tratamento de efluentes, com fibras óticas nos seus dutos, avançando em parcerias tecnológicas para entrar em áreas dos produtos ambientais. Ele está confiante na boa aceitação da companhia pelo mercado.
Sobre o questionamento do deputado Tiago Simon a respeito do direcionamento de oferta de ações para privilegiar sócio estratégico, Barbuti respondeu que não será necessário.
O chefe da Casa Civil, Artur Lemos, observou que o projeto de regionalização foi encaminhado em duas frentes, com urgência para os 307 municípios com contratos ativos, e outro projeto tramita na Assembleia sem urgência. Sobre a proposta do presidente Gabriel Souza, da formatação de unidades que trabalhem em conjunto com os municípios e sugestão de previsão de criação de sub blocos, disse que a alternativa foi elogiada pelos prefeitos. Lemos respondeu aos argumentos de que o governador prometeu na campanha eleitoral não privatizar a Corsan, dizendo que esse tema surgiu depois da aprovação do Marco Legal. Outra ponderação foi de que o Tribunal de Contas vai fazer a inspeção especial, como ocorreu na CEEE, Sulgás e CRM. E reiterou que a aprovação de leis municipais, questionamento que os prefeitos estão fazendo diante da insegurança jurídica, “é uma questão de interpretação”, conforme parecer da PGE. Conforme Lemos, “como governo acreditamos na universalização até 2033”.
Também o secretário do Meio Ambiente e Infraestrutura, Luiz Henrique Viana, argumentou em favor da proposta do governo, tendo em vista os índices de saneamento no RS e as dificuldades e incapacidade histórica em avançar.
Dos prefeitos convidados, apenas o de Palmeira das Missões, Evandro Luís, mostrou sua preocupação com o tema, uma vez que a companhia exibiu resultados positivos no balanço de 2020, alcançando 98,4% na cobertura do abastecimento de água e 17,1% no saneamento básico, com previsão de alcançar investimentos de R$ 864 milhões, conforme consta no balanço de 2021. “Com solidez econômica e financeira, vamos entregar uma concessão e não teremos nada em troca e nem segurança do que vai acontecer”, lamentou.
Pela Famurs, Marcos Rogério dos Santos disse que a entidade está consultando os prefeitos. Também o ex-deputado, ex-prefeito de Novo Hamburgo e ex-presidente da Corsan Tarcísio Zimmermann discorreu sobre os riscos de privatização da empresa.
Pelo Sindiágua, Arílson Wünsch discorreu sobre o bom desempenho financeiro da companhia e também o desempenho positivo no avanço do saneamento e abastecimento de água, “não precisamos de privatização, precisamos é de gestão”, acusando ações recentes que restringiram o avanço da Corsan. Reclamou que o salário dos servidores vem sendo exposto de modo indevido.
Urgência impede esclarecimentos
Nas suas argumentações, os deputados solicitaram a retirada do pedido de urgência dos dois projetos. Jeferson Fernandes (PT) disse que a Assembleia está a quatro dias da votação dos projetos e o tema, em virtude do pedido de urgência, não teve o debate necessário, uma vez que se trata de assunto complexo e que vai impactar na vida da população. Disse que foi surpreendido pela proposta do presidente da ALRS sobre as sub-bacias, um assunto que vinha sendo debatido sobre a regionalização, e indagou a respeito da apresentação de substitutivo na terça-feira, durante a votação. Antecipou que diversos prefeitos não pretendem assinar o aditivo aos contratos vigentes, uma vez que o assunto não passará pelas câmaras municipais.
Pepe Vargas (PT) destacou a insegurança dos prefeitos, pressionados a assinar aditivos aos contratos sem consulta às câmaras, e ainda a situação de municípios que não têm serviço superavitário e ficarão vulneráveis, uma vez que a iniciativa privada descarta investir nesses locais. E pediu os estudos técnicos que confirmam a viabilidade desse modelo de regionalização. Luiz Fernando Mainardi (PT) criticou a fuga do debate público, que no seu melhor formato seria o plebiscito, alertando que a água é um bem social
Tiago Simon (MDB), que também solicitou a retirada da urgência, insistiu na viabilidade da privatização sem parceiro estratégico, indagando se “a ausência desse parceiro não traria uma desvalorização das ações da Corsan”. Outra indagação foi sobre a privatização sem a regionalização e assinatura de 100% dos aditivos contratuais, uma vez que juristas apontam para a necessidade da aprovação da Câmara de Vereadores, “é possível definir a privatização sem a definição da regionalização, sem as assinaturas dos aditivos, isso não poderia gerar impugnação dos contratos?”, questionou.
O líder do governo, Frederico Antunes (PP), assegurou que as propostas cumprem o que determina o Marco Regulatório do Saneamento.