Hoje é o Dia do Gaúcho e, mais uma vez, o Rio Grande se veste de lenço e bombacha pra participar dos festejos pelo Dia da Revolução Farroupilha, dos desfiles, acampamentos tradicionalistas, apresentações artísticas e outros eventos que exaltam a cultura gaúcha e que nos lembram que o 20 de setembro foi o precursor da liberdade.
E eu, gaúcho de quatro costados, confesso pra vocês que não é o 20 de setembro ou a lembrança de uma guerra entre poderosos que me comove ou me orgulha. Pra mim, o que pode orgulhar é o cultivo das tradições campeiras, a cultura que produziu grandes nomes em muitas áreas do conhecimento, a dança, a música, o chimarrão de todo dia e o churrasco que me encantam e me fazem sentir parte desta terra que eu amei desde guri.
Não esse gauchismo que se orgulha de façanhas que nada têm de heroicas, não um lema que só existe na bandeira, não uma percepção distorcida de um confronto feito por interesses econômicos e não por grandes ideais republicanos, abolicionistas ou libertários. Não essa cega reverência a falsos heróis.
Longe disso.
Definitivamente, o 20 de setembro não foi o precursor da liberdade, e nós gaúchos ainda temos um longo caminho pela frente pra desconstruir uma história inventada que nos faz achar que somos melhores que os outros, esse patriotismo exagerado que acha que tudo que é de fora e diferente é pior.
Porque essa é uma prisão que não nos deixa avançar, e não nos deixa perceber que não somos nem melhores nem piores que ninguém, nem mais machos que outros só porque tomamos de um gole o mate quente.
A verdade é que precisamos deixar de lado esse estereótipo maniqueísta que nos separa entre o azul e o vermelho e entender que precisamos cultivar uma identidade que nos faz diferentes, mas sem essa de achar que somos sempre melhores que tudo que está acima do Mampituba.
Porque não somos, é só olhar e ver.
Hoje, pouco temos a nos orgulhar na educação, na segurança, na saúde, no desenvolvimento e cantar o hino riograndense em cima do hino brasileiro nos campos de futebol não mostra patriotismo, mas falta de educação.
Precisamos entender que pra que seja mesmo a terra onde tudo que se planta cresce é preciso muito trabalho, mas ainda mais que isso, é preciso reconhecer que acertamos e erramos, ontem e hoje, e entender que a gente cresce na diferença, na divergência e na diversidade.
Pra que a gente possa construir um entendimento que nos aproxime e não nos afaste, porque só assim a gente pode construir um lugar onde a gente possa se orgulhar de coisas reais.
Orgulho da nossa terra e da nossa gente, orgulho do sotaque, de um jeito de falar e de palavras que só a gente entende, orgulho de ser daqui. Porque o orgulho de ser gaúcho vai além da história e das coisas práticas e se traduz em um sentimento.
E é esse sentimento de pertencimento que precisa ser celebrado e alimentado. Só assim, quem sabe um dia, as nossas façanhas possam mesmo servir de modelo a toda terra.