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Censurado: O Livro Proibido de Tiradentes

Censurado: O Livro Proibido de Tiradentes

Tiradentes e os inconfidentes lutaram contra os excessivos tributos impostos pela Coroa Portuguesa. O Quinto era cobrado por Portugal e se referia a um quinto (20%) do ouro extraído na colônia. Esse fato ultimamente tem sido lembrado por muitos para chamar a atenção da passividade dos brasileiros de hoje em dia.

Pagamos quase dois quintos (40%) de tributos e aceitamos inclusive conversas e discussões que visam aumentar ainda mais a carga tributária.

Mas hoje quero lembrar outra história sobre Tiradentes. Que deveria ser mais conhecida.

Após sua prisão, foi apreendido entre seus pertences um livro. Infelizmente não se trata de um livro escrito por Tiradentes, já que ele não deixou textos conhecidos. Diferentes de outros inconfidentes ele não era poeta, tampouco escritor.

Mas o livro encontrado com ele ficou conhecido na época em Minas como O Livro de Tiradentes. Ele se chama Coletânea das Leis Constituintes dos Estados Unidos da América (Recueil des Loix Constitutives des États-Unis de l’Amérique), e era censurado em toda a Colônia.

É a tradução para o francês dos documentos constitucionais fundadores dos Estados Unidos da América: a Declaração de Independência, uma primeira redação dos Artigos de Confederação (que passaria a ser a Constituição Americana), um censo das colônias inglesas de 1775 e outros termos acessórios, como a Constituição de seis dos treze estados confederados. Destaque-se as Constituições da Virgínia e da Pensilvânia, modernas e, está última, bastante radical para aqueles tempos. Ambas traziam, vejam só, o direito inalienável de liberdade de expressão e de imprensa.

Os inconfidentes fizeram até mesmo contato com Thomas Jefferson, que à época era diplomata americano na França. Fato relatado pelo próprio Jefferson.

Impossível não pararmos para pensar como a história poderia ter sido diferente. Imagine, por um instante, se o Brasil tivesse virado república naquele momento – 1789. Imagine se fossemos parceiros das conquistas materiais, intelectuais e de direitos dos Estados Unidos desde aqueles dias. Imagine.

Mas isso são apenas especulações – o que poderia ter ocorrido. O que podemos, isto sim, ter certeza, é de que os ideais dos inconfidentes eram liberais. O Livro de Tiradentes comprova isso. Os inconfidentes estavam se espelhando naqueles documentos.

Da Declaração de Independência se extrai que são consideradas como “verdades evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade.”

Chama a atenção a defesa dos diretos de liberdade de expressão:

Da Constituição da Pensilvania: XII: Que o povo tem direito à liberdade de expressão, de escrever e de publicar seus sentimentos; portanto, a liberdade de imprensa não deve ser restringida.

Da Constituição da Virgínia: Seção 12. Que a liberdade de imprensa é um dos grandes baluartes da liberdade e só pode ser restringida por governos despóticos.

Tais artigos influenciaram o texto da famosa Primeira Emenda da Constituição Americana: “O congresso não deverá fazer qualquer lei a respeito de um estabelecimento de religião, ou proibir o seu livre exercício; ou restringindo a liberdade de expressão, ou da imprensa; ou o direito das pessoas de se reunirem pacificamente, e de fazerem pedidos ao governo para que sejam feitas reparações de queixas.”

Hoje não podemos visitar a casa de Tiradentes, pois ela não existe mais. A sentença imposta a ele, além do enforcamento, esquartejamento e exposição pública de seus restos mortais, determinou que a sua casa fosse destruída e o terreno salgado, como sendo o tratamento concedido aos “traidores” da época.

Mas podemos circular entre as ideias que formaram seu pensamento.

O Livro de Tiradentes original existe e faz parte do acervo do Museu da Inconfidência em Ouro Preto, antiga Vila Rica. Mais que isso ele está acessível, traduzido para qualquer um ler, editado pelo historiador britânico Kenneth Maxwell.

Imagino a satisfação que sentiria Tiradentes ao ver que os ideais que ele se inspirou formaram uma nação que não modifica a sua Constituição há mais de 230 anos.

Por outro lado, fico triste, pensando na decepção que Tiradentes teria ao notar que em 2023 no Brasil, já república, como sonhou, parte do Congresso quer aprovar uma lei que deixa uma porta escancarada para a (re) instituição de censura.

O destino de projetos de lei que visam facilitar qualquer forma de censura deveria ser um só: sua destruição, e depois ter sal jogado sobre suas cinzas.