Bento Gonçalves

Bolsonaro, o Papa e a gravidade

Não se engane, a vida é complicada e ler menos não vai mudar isto

Brazil's President Jair Bolsonaro and U.S. President Donald Trump shake hands during a joint news conference in the Rose Garden of the White House in Washington, U.S., March 19, 2019. REUTERS/Kevin Lamarque
Brazil's President Jair Bolsonaro and U.S. President Donald Trump shake hands during a joint news conference in the Rose Garden of the White House in Washington, U.S., March 19, 2019. REUTERS/Kevin Lamarque

De uns tempos pra cá tenho tentado ficar quieto e compreender o que está acontecendo. Todo mundo virou analista e todo mundo está com raiva e com vontade de classificar os outros. Ou se é bolsominion ou petista, ou terraplanista ou isentão.

Talvez nem valha a pena se debruçar sobre as causas – afinal, quem não esteve fora do Brasil na última década sabe mais ou menos quais são e porque estamos aqui. Mas, não se pode deixar de notar um certo apreço por uma simplificação das coisas na tentativa de demonstrar que a vida não precisa ser complicada. E, má notícia: ela é bem assim, complicadíssima a ponto de não caber em apostilas.

Até alguns dias atrás pensei que esta história toda de terraplanismo, de tão esdrúxula, era apenas uma tática pra nos distrair do que realmente importa. Mas, num mundo em que cientistas atá hoje divergem sobre as teorias da força gravitacional e procuram pelo gráviton, uma partícula que ajudaria a explicar as entranhas desta parte da física. Ora, nesta realidade é lícito imaginar a dificuldade que muitas pessoas tenham para compreender como é que todos ficamos em pé se a terra é redonda e não plana.


Aí vem o presidente da arminha e – nem sei em que contexto – diz que livros didáticos tem muito texto. Devemos voltar às pinturas rupestres talvez? me perdoem a falta de paciência, mas iremos nos restringir a estudar a taboada quando a disciplina for matemática? É impossível deixar de notar que esta fala tem tudo a ver com o momento que passamos. Nuances e diferenças sutis não são mais necessárias. Análises e controvérsias são descartáveis. O contraditório é subversivo e deve ser eliminado. Cada argumento contrário recebe por resposta a onomatopeia “mimimi”.

Violência? respondemos com porte de arma facilitado. Corrupção? Faz delação premiada? Criminalidade? Dá mais poder à polícia e manda o judiciário prender em ritos quase sumários. Sexualidade? Meninos de azul…

Esta descomplicação do processo educativo serve a quem? E veja não é culpa só dos governantes de hoje. As métricas para liberação de recursos públicos exigem aprovação em massa. O saber está emparelhado com o semianalfabetismo. Temos um país de diplomados úteis. Mal sabem compreender um texto. Então vamos reduzir os textos, descomplicar a vida. Argumentos serão desnecessários. Parece que basta saber de que lado se está e não há espaço para mais do que dois lados: bandido/mocinho, esquerda/direita, macho/fêmea. O mais é mimimi.

As simplificações tem levado a comparações que não cabem. O Papa Francisco, este homem que prega a paz e a temperança que vive de dar bons conselhos a gentes de todos os credos, este Papa Francisco se exaltou outro dia e reagiu com uma palmada contra uma fiel que foi muito invasiva. Logo vem as comparações com o presidente Bolsonaro. “Imagine se fosse o Bolsonaro”. Vou dar uma dica: tirem os trilhões de dólares que separam a economia do Brasil com a dos EUA, retirem bilhões que separam a fortuna pessoal do presidente americano com o brasileiro e aí podem comparar Bolsonaro com Trump.

É, o mundo tá bem facinho de entender mesmo. Tudo se conecta, tudo se explica. Bolsonaro é a nova tartaruga em cima do poste e a lei da gravidade não o retirará de lá, nem aguentaríamos mais um impeachment. Melhor esperarmos que fale menos e deixe o Brasil seguir seu rumo.