A equipe do Portal Leouve visitou o abrigo improvisado no ginásio poliesportivo do Sesi em Caxias do Sul. O objetivo foi verificar como funciona a operação e as condições de vida das famílias deslocadas da região de Galópolis e Vila Cristina, devido às intensas chuvas que afetaram nosso município. Pessoas que são atendidas por um contingente diversificado de voluntários, funcionários da Fundação de Assistência Social (FAS) e outros servidores municipais, que trabalham 24 horas por dia, para garantir o funcionamento adequado do abrigo.
REFEIÇÕES
Eler Sandra de Oliveira, assistente social da FAS, explica que são oferecidas cinco refeições diárias para aproximadamente 40 pessoas, incluindo café da manhã, lanche, almoço, lanche da tarde e jantar. Além disso, tem café, chá, água e frutas disponíveis a qualquer momento para as famílias. As refeições são preparadas por equipes de voluntários, que preparam os alimentos e os trazem em viandas. As equipes do local organizam as mesas próximo à cozinha do ginásio, e colocam sobre cada vianda talheres, além de uma variedade de saladas e sucos. Cada pessoa pega sua refeição embalada e se senta em uma das diversas mesas dispostas pelo salão.
VESTUÁRIO
Em relação às roupas, Eler explica que todas foram provenientes de doações. Diariamente, as famílias dirigem-se ao setor designado para as vestimentas e escolhem o que necessitam, desde camisetas e calças, até calçados. As roupas íntimas foram doadas por empresas locais do ramo, garantindo que cada residente receba kits personalizados. Se houver escassez de peças no local, equipes são enviadas ao ginásio de esportes do Seminário Diocesano Nossa Senhora Aparecida, no bairro Nossa Senhora da Saúde, em Caxias, para buscar mais doações. Desde a quinta-feira (02), em colaboração com a Fundação Caxias e o poder público, a Igreja Católica tem cedido espaço e fornecido ajuda, incluindo voluntários para organizar as doações.
Atualmente, uma necessidade crítica é a presença de voluntários para lavar as roupas sujas da população. Até o momento, apenas uma pessoa se ofereceu para realizar esse trabalho. Diariamente, ela coleta as roupas de manhã e retorna com elas, no final da tarde. Os interessados em ajudar podem dirigir-se ao abrigo localizado no Ginásio do SESI, na Rua Ciro de Lavra Pinto, 818, na divisa entre os bairros Fátima e Interlagos.
HIGIENE PESSOAL
Os horários para banho são estabelecidos em dois momentos: pela manhã, às 09h; e à tarde, às 17h. Aqueles que chegam após esses horários e precisam utilizar o espaço para banho podem fazê-lo, desde que comuniquem os funcionários responsáveis. Na entrada do abrigo, são disponibilizados shampoo e condicionador em porções individuais, para evitar desperdícios, além de escova e pasta de dente.
ACOMODAÇÕES
Após o cadastro realizado na chegada, cada família foi provida com colchões, cobertores e lençóis, garantindo todos os artigos de cama necessários. O objetivo é acomodar os moradores da vizinhança, promovendo um ambiente onde se sintam mais acolhidos, semelhante ao conforto de suas próprias comunidades onde conviviam com os vizinhos.
ATIVIDADES
Pela manhã, logo após o café, ocorre uma roda de conversa liderada pela assistência da FAS. Neste encontro, são discutidas as atividades do dia e as necessidades da população, incluindo possíveis demandas por atendimento médico ou produtos de higiene. As equipes do Sesi promovem diversas atividades, como alongamentos, jogos de basquete e futebol. Além disso, é oferecido acesso à internet via wi-fi para todos os moradores. Os desabrigados improvisaram uma sala de cinema, equipada com uma TV de grande porte, para momentos de lazer.
Profissionais da organização “Médicos do Sorriso” também se engajam em atividades com a população, trazendo um pouco de alegria para aqueles que enfrentam momentos tão difíceis.
MORADORA DE GALÓPOLIS
Em uma conversa com a diarista Marisete Lopes da Silva, de 48 anos, ela compartilhou que está no abrigo acompanhada da filha de 15 anos. A trabalhadora decidiu procurar abrigo devido à situação de risco na área de residência, localizada em Galópolis, na Rua José Marchi, onde viveu por 40 anos. Ela enfatizou que tem recebido um tratamento adequado no abrigo e que contribui com as tarefas de limpeza, organização das mesas e higiene dos banheiros. Marisete expressou a decisão de não retornar a Galópolis.
Como está sendo a vida no abrigo?
“Ah, está tudo ótimo, estamos até nos acostumando demais, a atenção é maravilhosa em todos os aspectos. Só temos a agradecer a Deus. Não temos do que reclamar, pois somos bem tratados. Até estou com medo de sair daqui com uns quilinhos a mais, de tanto que estamos bem alimentados. Além disso, colaboramos com as tarefas de limpeza, organização das mesas e higiene dos banheiros.”
Marisete também compartilha sua experiência do dia em que as chuvas começaram:
“Foi por volta de uma e meia da manhã quando tudo começou. Aquelas coisas horríveis acontecendo. Fiquei acordada até clarear o dia, não consegui dormir. No dia seguinte, peguei apenas meus documentos, não olhei para trás para os bens materiais ou para a casa. Bens materiais podem ser conquistados novamente, mas só temos uma vida.”
Você pensa em voltar para Galópolis?
“Não, não penso em voltar para Galópolis. Não será mais a mesma coisa, e meu estado psicológico não está bom para retornar lá. Estou aguardando encontrar um lugar onde possa ficar, pagar um aluguel, mas não pretendo voltar para lá. Preciso de um lugar simples, humilde, onde possa deitar na cama e conseguir dormir, algo que lá não me proporcionaria.”
MORADORA DE VILA CRISTINA
A agricultora Ivete Aparecida Fioreli, 52 anos, natural de Nova Prata do Iguaçu, Paraná, e residente na Vila São Pedro, no interior do distrito caxiense, relata que ficou quatro dias isolada com o esposo, de 58 anos, sem acesso a água, luz ou internet. Embora a casa não tenha sofrido danos, as obstruções de terra, pedras e galhos impediram-a, assim como seus vizinhos, de sair em busca de ajuda. Ivete está na localidade há dois anos e não tem planos de sair. Quando tudo isso passar, ela espera retomar sua rotina normal.
Como têm sido esses dias no abrigo?
“Tem sido maravilhoso. Todo mundo aqui nos trata muito bem. No começo, quando cheguei, tive algumas crises de choro, e hoje mesmo tive outra. Mas quando acontece, três ou quatro pessoas da assistência social vêm até mim, me abraçam e me dizem que estão ali, que não vão nos abandonar. Eu cheguei a pensar que poderiam se cansar de nós e nos mandar embora, mas elas afirmaram que não, que estarão conosco enquanto precisarmos delas.”
E como foi o resgate de vocês?
“Nós passamos pelo meio do mato, por uma abertura que os próprios moradores fizeram para ter acesso. Levamos quase três horas para atravessar. Havia muito lodo, muita água correndo e muitas madeiras grossas pelo caminho. Tivemos que pular por cima delas para conseguir sair.”
E quanto ao medo e à apreensão, como foi a noite durante o temporal?
“Ah, tive muito medo. Eu e meu marido dormimos em nossa casa na primeira noite, mesmo após um pequeno desmoronamento de terra. Na manhã seguinte, vimos tudo desabar: terra, pedras, árvores. Cheguei a gritar para que meu marido saísse de dentro de casa, mas ele só foi para a área e ficou observando enquanto tudo descia em direção ao rio.”
Como se sente ao ver sua comunidade destruída?
“É triste, com certeza. Mas para sair de lá, só se não houver outra escolha. Nossa casa tem apenas dois anos, é nova. Gastamos muito para construí-la, assim como para mobiliar. Viemos de São Paulo para cá e construímos tudo ali. Quando não houver mais nenhum risco, pretendemos voltar para lá.”
A expectativa é que os moradores das áreas de risco de Galópolis fiquem em abrigos ou nas casas de familiares até 19 de maio. A prefeitura considera que o retorno depende das análises das condições do solo.