Se há algo que variou ao longo dos meus anos de estudos jurídicos foi a estrutura do processo penal, “o caminho necessário”, parafraseando Aury Lopes Júnior, para aplicação de uma pena, porquanto nenhum pretensão à sua imposição pode se dar sem o processo penal (ressalvado o caminho sem volta e salutar da justiça negocial, inaugurada com a Lei dos Juizados Especiais Criminais, passando pela Delação premiada (especialmente com o advento da Lei Federal n.º 12.850/2013 e, posteriormente, o Acordo de Não Persecução Penal introduzida com o Pacote Anticrime).
Nao falo de qualquer processo, como mera condição de aplicação de pena, mas do devido processo legal, em que o juiz assegura a observância irrestrita dos direitos e garantias fundamentais do acusado. Por exemplo, um processo em que o juiz seja garantidor do contraditório, e não o contraditor, fazendo as vezes do Ministério Público.
E, nos últimos tempos, uma das mudanças mais significativas foi justamente a proclamação do Sistema Processual Acusatório no artigo 3.°-A de nosso Código de Processo Penal, em contraposição ao Sistema Inquisitório.
A diferença entre um e outro está em que, neste, o juiz oficia como um inquisidor, podendo diligenciar na busca da prova para dentro do processo; naquele (Acusatório), o juiz oficia como um espectador para, ao final, a partir das provas, decidir se procede ou não a ação penal.
Nesse contexto, a carga probatória é toda da Acusação. Se ela não convencer o juiz ou nele gerar dúvida, a absolvição é impositiva, pois em favor do réu milita a presunção de inocência, por disposição constitucional expressa.
Qual desses sistemas é o adotado no Brasil? Aí é que está a genialidade da designação “ilusório” que, aliás, não é minha; é de Aury Lopes Júnior (em seu Direito Processual Penal. 21.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2024), fazendo acirrada crítica (já na própria nota do autor à aludida edição) ao STF, por ter criado, na via interpretativa, um Sistema Processual Penal Misto (por isso, segundo o autor, Ilusório).
O ilusionismo decorre do fato de que os Sistemas Processuais Inquisitório e Acusatório são, em si, antônimos, pois, ou o juiz pode ir ele mesmo em busca da prova, ou não pode, um vez que o processo penal é um processo de partes, em que deve ser assegurada a paridade de “armas” (o bom combate, justo e isonômico).
Entretanto, o STF, a respeito do Sistema Processual Penal introduzido com o “Pacote Anticrime”, diz o seguinte: o sistema processual penal é acusatório; sem ele, não existe condições de possibilidade de termos um juiz imparcial. Então, o juiz não pode produzir ele mesmo a prova no processo penal, mas, se ele quiser, ele pode, para se convencer.