Opinião

O retorno da contabilidade criativa

Gastos com programas de distribuição de renda viraram investimento

O retorno da contabilidade criativa

Começamos voltando no tempo e para relembrar como a história no Brasil pode estar se repetindo. O ano era 2012, na época o ministro da fazendo era Guido Mantega. Em novembro daquele ano, Mantega concedeu uma entrevista à Globo News e falou sobre a contabilidade criativa que o governo da época usava para cumprir a meta fiscal. A manobra criativa era retirar os investimentos da conta e, assim, ajustar o resultado fiscal. A taxa Selic também foi forçada para baixo pelo Banco Central. A arrecadação veio menor do que o previsto. A economia começou a patinar. O resultado foi uma grave crise econômica em 2014 a 2016 no país.

Alguns anos depois, parece que estamos revivendo os mesmos capítulos. As estatais voltaram a ter uma função social, e o Tesouro já projeta um prejuízo de 8 bilhões de reais. Gastos com programas de distribuição de renda viraram investimento. O número de ministérios aumentou de forma assombrosa para garantir as pautas do governo. Os gastos do governo aumentaram e agora ele corre atrás de mais arrecadação. Diante deste cenário a meta zero déficit para 2024 ficaria cada vez mais distante.

Todavia, um dado divulgado recentemente chamou a atenção: as contas do governo. O número advindo do governo apontou para um superávit de R$11,55 bilhões no mês de setembro enquanto o Banco Central divulgou um rombo de R$16,5 bilhões. Segundo o chefe do departamento de estatística do BC é “altamente incomum” isso acontecer. A justificativa do governo foi a incorporação de fundos esquecidos do PIS/Pasep. Mas vale ressaltar que é a metodologia da autoridade monetária que conta para a meta fiscal.

O retorno da contabilidade criativa poderia fazer com que a meta zero do governo pudesse ser alcançada e comemorada pela equipe econômica, abrindo, neste caso, um embate de narrativas e deixando os dados em segundo plano. Deste modo, o governo poderia evitar as punições previstas por não cumprir a meta fiscal. Nada espantaria se houvesse uma campanha de demonização da equipe técnica do Banco Central. Algo muito parecido com o que aconteceu nos primeiros meses do ano quando a pressão era pela queda dos juros.

Viu-se também nomes totalmente alinhados com a ideologia do partido serem colocados em cargos técnicos, alguns causando reação forte no mercado. Em um futuro próximo não descartaria acontecer o mesmo com a autoridade monetária e, desta forma, os números não apresentariam diferença alguma.

Pior do que uma desequilíbrio nas contas do governo seria números totalmente maquiados, porque isso geraria insegurança e reduziria os investimentos no país. Embora, segundo o boletim focus, o mercado espere um déficit de aproximadamente 0,75% do PIB em 2024. A dúvida paira sobre a possibilidade de o governo não cumprir o contingenciamento de despesas. Números favoráveis ao governo permitiriam que a meta fosse virtualmente cumprida, evitando punições. Portanto, a diferença no resultado do governo divulgado são a fumaça e bem sabemos o que há onde há fumaça. O retorno da contabilidade criativa causaria um grande estrago econômico no país. Inflação, desemprego e empresas fechando.