Memória LEOUVE

Terceirização e superdosagem

Terceirização e superdosagem

É evidente que a terceirização de mão de obra é uma realidade no país há décadas e décadas, e que é exatamente por isso que é fundamental que a Legislação regulamente esse tipo de relação de trabalho, porque, em grande parte, é a insegurança jurídica que alimenta o desemprego, que não permite avanços e não é boa pra ninguém, nem empregado, nem empregador.

 

Esse ponto não tem discussão.

 

As dúvidas todas estão no modelo aprovado pelos nobres deputados nesta semana, que ressuscitaram um projeto de 1998 que o ex-presidente Fernando Henrique tentou passar e que amplia o que hoje existe em muitas empresas para atividades como serviços de limpeza, segurança e portaria, e não determina limites sobre o que pode ou não ser terceirizado.

 

Desse jeito, uma fábrica não vai precisar ter operários contratados por ela, uma grande loja não vai necessariamente contratar seus vendedores, uma escola não terá a exigência de ter seus próprios professores e nem um hospital se obrigará a ter médicos vinculados a ele.

 

Daí vem o medo de que a nova Legislação incentive as empresas a demitirem seus funcionários pra contratar terceirizados com um salário que, hoje é em média 24% menor, mesmo trabalhando três horas a mais.

 

E tudo isso vai valer também pro serviço público, mas é claro que ficam de fora os marajás das carreiras de estado, exatamente aqueles que ganham mais.

 

Esses casos, a possibilidade da contratação indiscriminada como pessoa jurídica e a ampliação dos prazos dos contratos temporários, o que em tese podem deixar o trabalhador sem direito a férias, 13°, FGTS e aviso prévio, justificam a reação de quem é contra.

 

Além disso, a nova libera a responsabilidade solidária da empresa contratante, que só vai responder por um eventual calote da terceirizada só depois que o “gato” seja cobrado.

 

Veja bem, nada disso, em tese, é essencialmente ruim. A questão é que isso impõe uma mudança de comportamento do mercado, tanto do empregador quanto do empregado, pra garantir o equilíbrio nessa relação pra que ninguém saia efetivamente prejudicado.

 

A verdade é que será preciso depurar o mercado, separar o joio do trigo e acomodar as melancias no andar da carreta. E isso vai levar algum tempo.

 

É evidente que em todo o mundo as relações trabalhistas estão mudando, e que por isso mesmo é preciso modernizar um sistema desatualizado como o brasileiro, modificar a clt em alguns pontos, desonerar as contratações pra ampliar o emprego e equilibrar as relações na justiça do trabalho.

 

 

E, pra garantir isso, é certo que o remédio vai ser amargo, mas é preciso assegurar que ele seja tomado por todos os doentes. E, principalmente, é preciso ter cuidado na receita, porque a superdosagem, antes de eliminar a doença, pode matar o paciente.