Memória LEOUVE

Debaixo dos tapetes do poder

Debaixo dos tapetes do poder

Nós estamos vivendo mesmo uma semana histórica neste país de democracia tão incipiente. Ontem, durante mais de 14 horas, a presidente afastada Dilma Rousseff depôs na primeira vez que um presidente depôs em um processo de impeachment no Congresso Nacional.

 

Isso porque, da primeira vez em que vivemos um processo de impedimento contra um Presidente da República, Fernando Collor de Mello renunciou ao mandato antes de exercer sua própria defesa diante dos senadores.

 

Ontem, Dilma Rousseff esteve altiva e digna diante dos senadores da República. Não houve bate-boca, não houve cinismo, não houve agressão de parte alguma. Apesar do verde e amarelo de alguns senadores que estavam lá mais pra posar pra foto histórica, apesar dos risinhos sarcásticos de outros, apesar da longa ficha corrida de alguns senadores que ali se revestiam da mais alta moralidade para julgar a presidente.

 

Dilma e a maioria dos senadores demonstraram, de modo até surpreendente, o decoro necessário para atravessar a turbulência desse momento histórico. E o momento é mesmo muito grave.

 

Se o que a vida nos cobra todos os dias é coragem, Dilma mostrou que tem de sobra, ao enfrentar seus acusadores de cabeça erguida e demonstrar uma admirável capacidade de resistir e de reafirmar sua defesa com os mesmos argumentos de que não há crime, de que há uma intenção de vingança de Eduardo Cunha de um lado, de que há uma intenção de retirar direitos dos trabalhadores de outro.

 

Dilma saiu da sessão maior do que entrou, mas ainda menor diante da inevitável cassação de seu mandato. Porque de nada adiantou o discurso, de nada adiantou a defesa. Porque o julgamento já está feito, porque o governo já acabou, porque Dilma já caiu antes mesmo do veredito final, e caiu não pelas pedaladas ou pelos decretos sem autorização, mas pelos erros de seu governo.

 

Hoje, os advogados novamente entram em cena, e, daqui a algumas horas, o governo Dilma será história, e será a história que irá julgar definitivamente a presidente. Se a presença digna da presidente diante dos senadores serviu para manter o processo em alto nível, também mostrou que o jogo está perdido.

 

A questão agora é saber como sair desse processo todo. Porque precisamos sair inteiros, mesmo que maculados pelo processo do impeachment, em dúvida pela falta de provas contundentes e pela ideia de que a pena é maior que a culpa.

 

A nós, caberá reconstruir um país, que não poderá sair desse processo como entrou. Principalmente porque precisamos reconduzir o país em busca do desenvolvimento sustentável, mas também porque precisamos seguir limpando a sujeira que há décadas foi escondida debaixo dos tapetes do poder.