Opinião

Plenitude de acusação?

Comentário de Sílvia Regina. (Foto: Reprodução)
Comentário de Sílvia Regina. (Foto: Reprodução)

No dia 30 de março último, fui assistir a uma Sessão de Julgamento no Tribunal de Justiça de Estado do Rio Grande do Sul. Era a primeira sessão presencial depois de quase dois anos de pandemia, inclusive com dispensa do uso de máscara. Passei a tarde lá.

O Tribunal, para que todos saibam, é um Órgão Colegiado. Nas Câmaras, nomeadamente, nas criminais, atuam três Desembargadores e um Órgão do Ministério Público. Dentre os Desembargadores, em cada processo, há um Relator. Ele abre o julgamento do processo, colhe o parecer do Ministério Público, ouve a Defesa, se houver pedido expresso de sustentação oral, para, só então, emitir o seu voto, no que pode ser acompanhado ou não pelos demais desembargadores.

O que reparei e me conduziu à reflexão? É que, vendo tudo aquilo, eu me questionei sobre a isonomia e a paridade de armas. Observei que a tal da paridade de armas é meio quimérica naquele ambiente. Um conceito mais acadêmico. Não havia me dado conta disso antes, desacostumada que estava com os meandros recursais.

Explico: assisti a várias sustentações orais de jovens advogados e outros nem tanto e alguns veteranos. Gente de toda idade. Todo o Relator ouvia primeiro a Acusação. Não lhe fazia qualquer menção de limitação do tempo no parecer, nem acelerava o Procurador de Justiça (como se chama o órgão do Ministério Público que oficia perante o Tribunal).
Não vi, em nenhum dos casos, os Desembargadores fazerem menção a lhe cassar a palavra.

Já com os advogados não ocorria o mesmo. O tempo era cronometrado: dez minutos. Todos os argumentos, independente da complexidade da causa, tinham que ser incluído naqueles dez minutos, findos os quais, o Relator determinava que se encaminhasse a finalização da sustentação oral. Não foi uma nem duas vezes que ouvi advertências de que o Relator iria lhes cassar a palavra.

Os advogados mais preparados conseguiam fazer um fechamento. Outros, a gente percebi nitidamente que perdiam o rumo da prosa. Na ânsia de concluir, abandonavam ou esqueciam o essencial. Ficavam totalmente desestabilizados. Naquele meu jeito meio mãezona, sentia pena da meninada e um autoritarismo difícil de aceitar.

Vi que muitos, muitos, mesmo, defendiam integrantes de facções criminosas, causas que me embrulham o estômago; que não passam pelo meu filtro moral e que eu não defenderia por valor nenhum.

Mas confesso que, saindo de dentro da garrafa, olhando de fora para dentro, tive a sensação de estava vendo acontecer, ao vivo e a cores, uma garantia de plenitude e amplitude de acusação, e não de defesa.

Punir é preciso. Punir é civilizatório, parafraseando meu filho advogado Alberto Fernando Becker Pinto. Mas não de qualquer jeito e nem sem ponderações desse viés que trago aqui para reflexão, quem sabe, para aprofundamentos, inclusive sobre a utilidade da tal sustentação, quando os votos são previamente disponibilizados (com antecedência) entre os julgadores. Se permitem sustentação oral, precisam viabilizar tempo suficiente para que alguém, com algum argumento, mude o que consolidado já está; que ela não sirva para desgaste da Jurisdição (um mero “suportar” ou “ter que ouvir”) e nem para desestabilizar um orador, uma questão que eu gostaria de ver abordada por alguém em uma Dissertação de Mestrado.