Bento Gonçalves

Prefeitura de Bento é condenada a devolver recursos de centro esportivo

União também foi citada e contestou a ação (Foto: divulgação)
União também foi citada e contestou a ação (Foto: divulgação)
União também foi citada e contestou a ação (Foto: arquivo)

O município de Bento Gonçalves terá que devolver com correção ao governo federal os recursos investidos nas obras de melhorias do Parque Esportivo Montanha dos Vinhedos, pelo não-cumprimento do contrato do convênio estabelecido com o ministério dos Esportes. A decisão foi tomada nesta quinta-feira, dia 16, pelo juiz Frederico Valdez Pereira, da 1ª Vara Federal de Bento Gonçalves, e determina a rescisão do contrato e a devolução do dinheiro devidamente corrigido.

De acordo com o procurador-geral do município, Sidgrei Spassini, a prefeitura deve recorrer da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre. Antes de recorrer, a prefeitura deve paralisar as obras e solicitar a suspensão dos repasses assim que a prefeitura for intimada. “Vamos recorrer para que nâo se fique mais uma obra paralisada”, afirmou o procurador.

O convênio com o Ministério dos Esportes, assinado em dezembro de 2012, previa a liberação de um total de R$ 1.983.518,78 para a construção de um centro de alto rendimento no Complexo Esportivo Montanha dos Vinhedos, mas, desde lá, diversas exigências contratuais não teriam sido cumpridas pelo município.

De acordo com o secretário Geral de Governo de Bento Gonçalves, Enio De Paris, mais de 50% das obras já foram realizadas, mas nem todo o recurso foi liberado até agora. No ministério, mais de 60,26% aparecem realizados, com a liberação de R$ 1.262.766,18. De Paris afirma que a obra está sendo executada a partir de uma liberação do Ministério dos Esportes com prazo de conclusão dos trabalhos em dezembro deste ano, o que segue sendo a in tenção do município.

“Temos a liberação do ministério e as obras estão em andamento”, garantiu o secretário.

Em fevereiro de 2014, técnicos da extinta Controladoria-Geral da União (CGU) concluíram que o objetivo do convênio estaria comprometido, e que apenas um dos itens do contrato havia sido licitado e contratado. Na época, a prefeitura alegou que as obras estavam marcadas para começar apenas em abril, enquanto o projeto original previa a conclusão das obras no mês anterior. Naquele momento, com R$ 912.418,53 recebidos e a menos de cinco meses da Copa, Bento Gonçalves já não tinha mais esperanças de receber uma seleção.

Para o Ministério Público Federal (MPF), que solicitou a suspensão do convênio em junho do ano passado em uma ação civil pública contra a Caixa e a prefeitura, apontou que duas condições suspensivas, que bloqueiam o contrato, não foram atendidas: uma de titularidade da área, que pertence ao Clube Esportivo Bento Gonçalves, e a outra, de licença ambiental. Na época, o juiz também havia proibido a CEF de efetuar pagamentos do contrato, determinações que foram revertidas pelo TRF4.

A prefeitura havia contestado as supostas irregularidades, alegando a regularidade da área em novembro, e conseguiu derrubar a liminar, mas agora o juiz federal afirmou que as condições suspensivas já deveriam estar resolvidas na ocasião da celebração do contrato de repasse. Segundo ele, não se poderia nem cogitar a possibilidade de comprovação posterior do seu cumprimento, inclusive o Manual de Procedimentos da Caixa proíbe expressamente esta prática. “Ainda que haja um prazo considerável para o atendimento da cláusula suspensiva, não há dúvida de que o contrato não deveria ser executado enquanto não se verificasse o seu cumprimento”, comentou o magistrado.

Pereira entendeu que, à época da contratação, o município não tinha qualquer espécie de poder sobre o imóvel onde se executariam as melhorias. A cessão do direito de superfície apresentada, a qual foi elaborada na forma de instrumento particular, só veio a ser registrada na matrícula do imóvel em abril de 2016, quando o contrato já estava em plena execução, em razão de vários defeitos constatados na documentação.

Já com relação à licença ambiental, o juiz notou que a Licença Prévia foi emitida em fevereiro de 2015 (momento posterior à contratação e à aprovação do projeto pela CEF). Além disso, nunca houve a emissão de Licença de Instalação e Operação.

O magistrado ainda apontou que as irregularidades não se restringiriam ao cumprimento das exigências, pois a documentação revelou que o estádio – destinatário das melhorias subsidiadas pela União – nunca foi averbado na matrícula dos imóveis.  Ele reparou também que a cessão entabulada entre Município e Fundação não conferiria ao ente público os plenos poderes de uso do imóvel. Ao contrário, o ajuste aparentemente concederia um direito de superfície apenas para que o Município promovesse as melhorias estruturais, enquanto o uso efetivo dependeria de o imóvel estar livre. “As referidas instalações continuam sendo de exclusiva propriedade e utilização pela entidade privada com a natureza de clube de futebol; a aludida cessão de direito de superfície não transfere nenhum direito real ao Município, e a simples utilização da área, possível apenas uma vez ao mês, depende sempre da prévia anuência da entidade privada”, afirmou Pereira.

Como se observa, a contratação foi permeada de falhas, seja na formalização, seja na execução”, comentou o juiz, acrescentando que, mesmo diante das informações contraditórias, a CEF autorizou a execução das obras e repassou os valores contratados. Ele considerou que o município de Bento Gonçalves figurou, na prática, como “mero intermediário para o repasse das verbas, viabilizando a entrega de valores públicos para a reforma das instalações físicas utilizadas pelo Clube Esportivo Bento Gonçalves”.

Quanto à suposta vinculação da Copa do Mundo 2014 ao objeto do contrato, o juiz entendeu que não constaria nem mesmo das orientações acerca do programa governamental. Para ele, ficou claro que o programa governamental tinha como justificativa a realização do evento, mas o objetivo era incentivar a disponibilização de estruturas adequadas à prática desportiva, fomentando o esporte local e mesmo a realização de outros eventos do gênero.

O magistrado julgou que as provas trazidas ao processo demonstrariam que a execução do contrato nunca deveria ter sido iniciada, visto que parte das irregularidades persistem até os dias atuais. “De modo temerário, os concedentes anuíram com documentação falha e liberaram os recursos públicos (…) para a reforma do equipamento esportivo do Clube Esportivo Bento Gonçalves”, afirmou.

Pereira determinou a rescisão do contrato e condenou o município e a Caixa Econômica Federal a restituírem aos cofres da União todos os valores repassados, atualizados. A forma como será feita esta devolução será definida na fase de cumprimento de sentença.