Opinião

Coleta de DNA

Confira o artigo semanal da Dra. Silvia Regina Becker Pinto

Coleta de DNA

Nossa Constituição Federal estabelece, em seu artigo 5.º, inciso LVIII, que a pessoa civilmente identificada não será submetida à identificação criminal. Há tempos, venho pensando em escrever algo sobre isso, em face da questão da coleta do DNA em sede de execução da pena. Hoje é o dia.

Existe – e deve existir – uma preocupação especial de nosso sistema jurídico em não processar a pessoa errada, pois isso configura odioso erro judiciário. Por isso, a Lei 12.037/2009, com as modificações da Lei 12.654/2012, aliadas à LEP (Lei das Execuções Penais) procuram dar o máximo de segurança jurídica de que o acusado e o condenado são as pessoas certas, razão pela qual restou criada uma hipótese de identificação criminal obrigatória.

Por tais razões, mesmo já possuindo identificação civil, indiciados ou condenados podem ser criminalmente identificados. Porém, em se tratando de delitos dolosos graves, como, por exemplo, o homicídio, o roubo, o latrocínio, o estupro (e todos os hediondos), os condenados devem ser criminalmente identificados pela extração do DNA. Já não era sem tempo essa providência.

É verdade que ninguém está obrigado a fazer prova contra si próprio. Tanto é que o acusado pode ser conduzido à presença das autoridades policial e ministerial, mediante previa intimação desatendida, e autorização judicial, ou mesmo a juízo, somente para atos que não possam ser realizados sem a sua presença (reconhecimento, por exemplo), exceto o interrogatório, pois os acusados em geral possuem direito ao silêncio. Não por outra razão, ninguém pode ser compelido ao teste do bafômetro, assim como ninguém está obrigado a fornecer material genético para sua incriminação.

Contudo, a coleta de material biológico (DNA) do condenado por crimes graves ou hediondos contra a pessoa, por métodos não invasivos (como já ocorre, aliás, com a fotografia e a impressão datiloscópica), para que conste em banco de dados sigiloso, somente acessível mediante previa autorização judicial, em nada se confunde com a ideia de vedação de exigência de que o acusado produza prova contra si próprio.

Isso porque, ocorrendo um delito, incumbe à Polícia Judiciária extrair da cena do crime, ao máximo possível, todos os elementos que possam servir a um padrão de confronto, no intuído de identificar quem foi o autor da infração penal, no que se inclui, exemplificativamente, sangue, fios de cabelos, sêmen, fibras, impressões digitais).

É preciso se ter em conta que o material retirado da cena do crime não é extraído compulsoriamente do autor do fato. Ele simplesmente está ali e é colhido pelo agente estatal. Nada, aliás, diferente do que ocorre com a arrecadação de vídeos de câmeras de monitoramento localizadas no entorno do local da infração penal.

Na coleta do DNA, portanto, o condenado não faz prova contra si mesmo. O DNA armazenado apenas assegura sua completa identificação. A prova contida no banco de dados genéticos pode inclusive servir para exclui-lo da condição de autor de um crime, sendo nada menos do que antes referimos como segurança jurídica.

Porém, o mais importante disso é que, se, no futuro, o mesmo condenado voltar a cometer um delito, por meio do banco de dados com o material genético, hoje é possível, como nos filmes americanos, que o Estado, pelo confronto, identifique a autoria, o que, além de segurança, aperfeiçoa o sistema investigatório.

Vale, ainda, um registro: o Pacote Anticrime (Lei 13/964/2019) trouxe a novidade de permitir que o titular dos dados genéticos tenha acesso ao seu perfil genético armazenado, bem como a toda a cadeia de custódia, podendo contrariá-la em eventual defesa.