Cada um fará a leitura que quiser e mesmo assim o resultado não irá mudar o que aconteceu na tarde de sexta-feira na Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves. Foi um momento histórico em que pela primeira vez os vereadores optaram por tirar o mandato de um colega. E, tenham a certeza, de que por mais que se tenha ouvido uma salva de fogos de artifício em comemoração minutos após o resultado, ainda assim a maioria dos veredores estava incomodada e com nervos à flor da pele.
Não foi fácil – O vereador Paulo Roberto Cavalli, o Paco, é o secretário da mesa e coube a ele fazer extensa leitura. Errou, gaguejou e leu muito mal. Pura tensão. O Vereador Sidinei da Silva, também à mesa diretora, quase não piscava. E outro que errou foi o vereador Neri Mazzochin. Ele que reiteradamente prega a necessidade de pena de morte aos corruptos e bandidos, não conseguiu sequer impor a cassação de mandato ao colega Camerini. Se deu mal ao dizer que achava a pena excessiva, mas reconhecia que o colega tinha culpa. Não entendeu que não lhe cabia dosar a pena. Era votar sim ou não. Como quis se abster foi considerado ausente. Ou com voto nulo como declarou o presidente Pasqualotto, que não conseguia se fazer entender ao vereador do PP.
Um votinho – Eram necessários 12 votos para retirar o mandato de Moacir Camerini. A ausência um tanto quanto estranha do vereador Moisés Scussel contou a favor do réu. A “abstenção” de Mazzochin também. O suplente, pastor Edilson não quis votar da mesma forma que alguns colegas da bancada evangélica. Por isso votou com Camerini. O próprio réu disse não à penalidade que estavam por impor a ele. Se Camerini tivesse convencido só mais um vereador a se abster, a viajar para Brasília ou votar com ele, só mais um voto, um votinho e ele permaneceria Vereador.
Direitos mantidos – Como convém a quem não costuma ouvir os outros e não abre mão de seu jeito de pensar, o vereador cassado se acha injustiçado, vítima de perseguição. O único mea culpa que fez foi o de ter contratado mal e confiado em quem não deveria – os assessores que o acusaram de ser mandante dos perfis falsos utilizados em redes sociais para destratar adversários políticos. Camerini sai do Palácio 11 de Outubro como homem comum. Não perdeu seus direitos políticos e poderá votar e ser votado em outubro de 2020. Poder-se-ia dizer que restou humilhado do episódio. Porém, quem conhece minimamente o vereador há de saber que este não é um sentimento que lhe passará por perto. Antes disto, sai com a vontade duplicada ou triplicada de voltar à Casa em 2021, fato que só não deve ocorrer se a Justiça impedi-lo com nova penalidade.
Suplente decisivo – Durante 55 minutos o réu fez uso da tribuna. Importunou um ou outro colega e até a jornalista da Casa, mas ainda assim tentou ser simpático e pediu que os colegas o livrassem da pena. Só saiu do tom mesmo quando viu entrar no recinto aquele que não votou mas foi seu algoz. O vereador Anderson Zanella, sempre chamado de “vereador suplente” por Camerini, mostrou que mais vale um suplente articulado do que um vereador isolado e agora sem mandato.
Articulação – Aqui é preciso fazer um parênteses: possivelmente nunca se saberá ao certo sobre todos os bastidores da semana que culminou com a primeira cassação de um mandato em Bento Gonçalves. Mas é certo que o líder do governo na Câmara articulou minuciosamente cada passo e precisou segurar cada um dos 12 votos com convencimento, convicção e sabe-se lá que outros argumentos. Depois de trazer o Esportivo de volta à primeira divisão do futebol Gaúcho impôs uma derrota dura ao maior crítico do Governo Municipal. Zanella fecha o ano com a sensação de dever cumprido.
Jogar em equipe – Camerini pode até não saber os motivos que levaram à sua cassação. Para muitos é o único vereador oposicionista. Aliás os seus seguidores de redes sociais não compareceram em peso. 12, talvez 15 ficaram até o final. Restou provado que o coletivo vale mais do que as mais de cinco mil proposições levadas a plenário pelo vereador em sete anos. Um vereador sozinho não faz verão. Camerini raramente teve suas propostas aprovadas simplesmente porque não sabe jogar em time. Neste sentido sempre foi muito cênico e pouco efetivo. Bom para quem quer circo, ruim para quem desejava ver o buraco de sua rua fechada.