Opinião

Até quando?

Até quando?

Como ex-reitora e sob o impacto da notícia do suicídio de um colega de gestão, ainda estou meio anestesiada.

No mundo cor de rosa em que muitos de nós vivemos, sobreviver a uma acusação (infundada ou não) parece uma coisa simples. Raciocínio: se sou acusado, me defendo e assim, num passe de mágica, tudo passa e se resolve.

Como se o processo de defesa não fosse árduo, doloroso, difícil e vergonhoso, principalmente para aqueles que não tem culpa, mas que carregam o peso de ter o seu CPF no ordenamento de despesas de uma instituição pública. Como se as pessoas entendessem, de forma tranquila, que posso ser acusado mas não ter culpa.

Ao contrário, diz o senso comum dessa nossa sociedade – se a polícia, o MPF e o juiz mandaram prender, então ele deve ser culpado, na linha do ditado popular “se há fumaça, há fogo”. Esquecem-se que, embora a fumaça derive do fogo, ela pode vir do terreno alheio e contaminar seu quintal.

Me dei conta de que esse fato triste tem a ver com o que se discute dia e noite sobre Lula hoje. Ele sabia? Não sabia? O reitor da UFSC estava ou não envolvido em algum tipo de improbidade? A verdade é que isso não importa.

Não se discute se a justiça deva ser feita, ela deve. O que se deve condenar veementemente é o JUSTIÇAMENTO, a EXECRAÇÃO PÚBLICA de qualquer pessoa sem culpa formada, que é o que se vê cotidianamente nas redes sociais e na mídia em geral. Tudo na linha do ditado popular: “olho por olho e dente por dente”, desde que com os olhos e os dentes dos outros. Quando o problema for comigo, quero todas as prerrogativas legais do processo.

É alarmante as ações que criminalizam a gestão pública. Os órgãos de controle do judiciário conseguiram manter a atribuição de investigar anos atrás, o que a população saudou com uma grande coisa, achando o máximo. Tudo na linha de “quem não deve não teme”, como se todos os procuradores e policiais fossem honestos, imbuídos da “bondade humana” e nenhum deles abusasse de seu poder e funções. O eterno maniqueísmo humano – ser do judiciário ou da polícia garante as pessoas bom caráter. Argumentos de uma superficialidade absurda, de um desconhecimento descomunal da evolução do homem.

Para culminar, o senso comum ainda coloca tudo isso numa mera disputa ideológica – quem defende o corruptor é de esquerda, quem defende a lei é de direita. Surreal e muito triste.

Ainda vou voltar a esse assunto em outras colunas, por que a de hoje não vai esgotar o tema.

Não tenho bandido de estimação, como muitos gostam de me dizer. Tenho vidas de estimação, tenho consciência de estimação, tenho trajetória de estimação, tenho solidariedade de estimação, tenho humanidade de estimação. E me orgulho disso.

Deixo aqui minha solidariedade profunda à família do reitor da UFSC, Dr. Luis Carlos Cancelier. De minha parte, não me interessa se ele era culpado ou não, mas sim que a vida de sua família se foi. E, se por um acaso, for apurada sua inocência, o MPF, a PF e a juíza que ordenou a prisão terão em suas mãos e em suas consciências o sangue de um inocente e a tragédia pessoal de todos envolvidos. Tudo em nome da irresponsabilidade e da leviandade com que se trata a honra e a trajetória das pessoas.