Caxias do Sul

Mensagem do Dia: "O Herói de Emily"

Mensagem do Dia: "O Herói de Emily"

Era uma tarde típica de verão quando cheguei no elevador do nosso prédio residencial após levar minha filha de oito anos a uma consulta de rotina. Dentro do elevador tinha uma moradora que eu não conhecia. Ela estava com seu filho que apresentava ter a mesma idade de Emily.

O menino bateu palmas e começou a balançar os braços quando viu minha filha entrar e logo Emily me perguntou em voz alta o que ele tinha. Eu sabia o que ela queria dizer, pensei por um momento sobre como deveria ser difícil para aquela mãe diante de mim.

– Ele só está feliz querida. Gostou de você.

Emily sempre foi muito perceptiva e logo tirou suas conclusões. Enquanto eu me apresentava para Dora e descobria que ela era uma moradora nova e que havia comprado o apartamento acima do meu, Emily batia palma com o Lucas. Antes de sairmos do elevador ela me pediu se Lucas poderia ir brincar com ela lá em casa. Dora ficou surpresa com o convite e disse que não se sentia confortável em deixar ele ir, mas que Emily seria bem-vinda para ir até o apartamento dela. E foi o que aconteceu.

Os poucos minutos em que Emily passou com o Lucas no elevador, ela observou suas limitações e naquela tarde levou um pequeno quadro e giz. Mais tarde, Dora me telefonou para avisar o quanto Lucas se divertiu com Emily e que estavam criando um código próprio para se comunicarem. Dora estava surpresa com as respostas espontâneas de Lucas e seu comprometimento.

Logo Lucas passou a frequentar nossa casa. Assim, teve sua primeira festa do pijama e todas as vezes que dormia em nosso apartamento, Emily dormia na cama de cima do beliche em seu quarto, enquanto ele ficava com a de baixo. Ao longo do tempo passamos a compreendê-lo melhor usando o código que ele e Emily criaram. Também passei a conhecer melhor a paralisia cerebral e as limitações de Lucas. Minha filha se tornou sua melhor amiga, muitas vezes trocamos destinos para que Lucas fosse incluído no passeio, já que era uma constante exigência de Emily. Dora e seu marido passaram a frequentar nossa casa com frequência e assim como Emily, eu havia ganhado uma amiga.

Em um sábado, exatos dois anos depois em que Emily e Lucas se conheceram naquele elevador. Acordei escutando as palmas de Lucas. Olhei para o relógio e marcava duas horas da manhã. Fiquei em silêncio por um momento e então ouvi novamente as palmas de Lucas. Imaginei que eles ainda estavam acordados, pois era através das palmas que ele se comunicava. Palmas horizontais eram um sim, palmas verticais eram um não, entre outros movimentos que tinham um significado entre os dois.

Levantei pronta para dar uma bronca da dupla travessa. Quando abri a porta do quarto, vi minha filha do chão desmaiada. Ela tinha caído do beliche e batido a cabeça. Havia terror nos olhos de Lucas e suas mãos estavam vermelhas de tanto bater palmas para tentar nos avisar da única forma que conseguia. Emily foi levada às pressas para o Hospital e segundo o médico, ela poderia ter ficado com sequelas, caso tivesse ficado mais meia hora sem atendimento.

Hoje com meu marido já falecido, minha Emily vai subir ao altar acompanhada de Lucas, seu melhor amigo, o herói que salvou sua vida. Ele vai caminhar com ela batendo muitas palmas, tenho certeza disso. E ela vai sorrir para ele entendendo o que cada palma significa. Ele vai tropeçar em diversos trechos do curto caminho. Mas ela vai segurá-lo em todo percurso.

Porque, naquele dia no elevador, eu só quis ser gentil e me colocar no lugar daquela mãe. Mas, Emily viu Lucas como ele realmente é: um herói.

 

Autora: Juliana Barbosa