OPINIÃO

Arquitetura em tempos de mudanças climáticas

O futuro não é mais uma projeção distante. Ele está batendo à nossa porta, molhando nossos pés, secando nossos campos

Casa moderna com fachada envidraçada, gramado e árvores. Arquitetura residencial.
Imagem: Cristina Mioranza/Divulgação

Nos últimos anos, temos testemunhado eventos climáticos extremos com uma frequência cada vez maior. Chuvas intensas em poucos minutos, estiagens prolongadas, ventos destrutivos, alagamentos em zonas urbanas e deslizamentos em áreas de encosta. As cidades da Serra Gaúcha, com sua geografia acidentada e sua ocupação muitas vezes desordenada, sentem de maneira aguda os impactos dessas mudanças. E é preciso admitir: a arquitetura e o planejamento urbano precisam se adaptar com urgência.

Durante muito tempo, projetamos como se o clima fosse estável e previsível. Como se os rios não fossem transbordar, as temperaturas não fossem subir e o solo não fosse ceder. Agora, estamos diante da necessidade de rever métodos, materiais, prioridades. E, mais do que isso, de repensar a forma como urbanizamos nossas cidades.

Impacto nas Cidades da Serra Gaúcha

Em áreas como Bento Gonçalves, Farroupilha e Nova Petrópolis, por exemplo, a ocupação de encostas e margens de rios tem sido um problema crônico. Em alguns casos, a própria topografia natural é alterada para permitir loteamentos, sem a devida atenção à drenagem e à contenção. A impermeabilização excessiva do solo agrava as enxurradas. A ausência de planejamento hídrico nos bairros periféricos é um risco constante. A arquitetura não pode mais ignorar o território.

Soluções Baseadas na Natureza e o Papel do Poder Público

É urgente adotar soluções baseadas na natureza: calçadas permeáveis, jardins de chuva, sistemas de captação e reuso de água da chuva, arborização com espécies nativas, telhados verdes e fachadas ventiladas. Edificações que respeitem o clima, que minimizem o uso de energia artificial, que se integrem ao meio e que não tentem dominá-lo. Precisamos abandonar o modelo da construção como resistência ao ambiente e passar a vê-la como uma extensão dele.

E o poder público também precisa fazer sua parte. Investir em mapeamentos de risco, em planos diretores atualizados e participativos, em fiscalização séria, em saneamento básico, que é, inclusive, uma questão ambiental e climática. Cidades resilientes são aquelas que se antecipam aos problemas, não as que apenas reagem aos desastres.

Fachada de casa moderna com tijolos claros, madeira e detalhes em pedra. Garagem com portão preto.
Imagem: Cristina Mioranza/Divulgação

Lições do Veneto

Um grande exemplo de adaptação ao clima e gestão de riscos naturais é a região do Veneto, na Itália. Desde o início do século passado, se investiu em sistemas de proteção de encostas e margens de rios, o que a tornou um modelo para outras regiões. O Veneto é um exemplo de como a gestão sustentável e a adaptação ao clima podem ser implementadas com eficácia, protegendo tanto o meio ambiente quanto a população.

A arquitetura tem, aqui, um papel vital. Não apenas como técnica, mas como linguagem. Projetar hoje é também um ato de responsabilidade ética com as gerações futuras. Significa construir não apenas para hoje, mas para os dias de calor extremo, para as chuvas de verão, para a escassez de água. Significa entender que cada telha, cada janela, cada rampa, cada calçada é uma peça de um sistema maior, que precisa ser pensado com inteligência climática e sensibilidade humana.

O futuro não é mais uma projeção distante. Ele está batendo à nossa porta, molhando nossos pés, secando nossos campos. Cabe a nós, arquitetos, cidadãos e gestores públicos, atender a esse chamado com coragem, ciência e cuidado.

Casa moderna com piscina, gramado e pérgula de madeira. Arquitetura e paisagismo.
Imagem: Cristina Mioranza/Divulgação