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O problema do decisionismo judicial

Li, por curiosidade, de Lênio Luiz Streck, uma obra que são vários artigos abordando, como matéria de fundo, uma crítica ao decisionismo judicial, ao subjetivismo e ao ativismo judicial que já não permitem que se diga o direito é: ele é o que o juiz, segundo sua consciência, diga que ele é.

Disso decorre que os juízes, e não o Parlamento, numa espécie de loteria, estão ditando o direito. Como pensam diferente sobre o mesmo fato, o direito será definido a depender do juiz, em aviltamento ao princípio democrático e à isonomia, porque aquilo que é para um litigante pode não ser para o outro. Tudo depende (e isso gera insegurança jurídica).

Conforme o jurista antes referido, isso ocorre pela carência que temos de uma Teoria da Decisão que obrigue os juízes a decidir o direito por princípios e não pela finalidade, teleologia ou consequências.

Esses princípios estão todos democraticamente dispostos na Constituição, a orientar, em bases democráticas e jurídicas, toda a decisão, independente de suas consequências, doe a quem doer: hermenêutica constitucional. Interpretação ou é constitucional ou é gambiarra. Simples assim.

Concordo em quase tudo com a argumentação de base do autor. Ninguém mais suporta esse decisionismo que se estabeleceu no Direito brasileiro, onde a solução depende do livre convencimento do juiz, segundo sua consciência, conquanto a decisão seja fundamentada, que pode coincidir ou não com o direito.

O caminho apontado pelo autor é, efetivamente, uma boa solução para dar cabo nesse pandemônio em que se transformou a jurisdição nesse país, em que cada juiz pode decidir como quiser (livre convencimento motivado).

No que divirjo (se é que divirjo)? É que o autor confia demasiado na Constituição. Ele a diviniza, enquanto eu nem tanto, e explico.

Enquanto ele entende que a Constituição contém em si o Direito todo, eu sustento que não; que o Direito (do qual a justiça não pode se dissociar) a precede. Vem antes, sendo ele mesmo a fonte legitimadora da Constituição: não é qualquer coisa que, por consenso democrático, possa se transformar em direito constitucionalmente válido.

Além disso, tenho outro argumento para não divinizar a Constituição: eu, ao revés da crença da Revolução Francesa, não tenho tamanha confiança no Parlamento, devido às forças reais de poder (parafraseando Ferdinand Lassalle in “A Essência da Constituição”) que nela operam desde o início).

Basta olhar para a nossa Constituição Democrática de 1988 e observar o número de Emendas Constitucionais que ela já sofreu. Temos uma colcha de retalhos. Demais disso, é assustadora a rapidez com que o “Poder Democrático” a emenda. Quando há vontade política, é para já que se reúnem e o fazem.

Sinceramente, tenho que nenhum uma pessoa, nem um grupo delas ou mesmo sua totalidade, pode transformar em justo ou direito válido o que não é.

De qualquer modo, acho muito pertinente o debate proposto pelo autor e não me julgo dona da verdade para afirmar que ele não tenha razão. Ao contrário, compreendo que é do confronto de ideias que o Direito – que adquire uma independência- possa ser refletido.

Silvia Regina Becker Pinto

Advogada e Professora. (espaço de coluna cedido à opinião do autor)

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