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É namoro ou o que é?

Um assunto que está “pipocando” por todo o lado no Direito é o chamado “Contrato de Namoro”. Por estranho que pareça às pessoas da minha idade, como falei outro dia, na minha participação semanal no Jornal da Manhã da Rádio Jovem Pan da Serra. Mas, de fato, o assunto é atualíssimo, como é legítima a preocupação das pessoas com a sua propriedade que, aliás, a Constituição Federal afirma ser direito fundamental do indivíduo.

Imaginem a seguinte situação: você está namorando. Você tem patrimônio, mas o namorado ou a namorada não. Você corre algum risco patrimonial? De regra, não. A lei não prevê direitos e deveres na relação de namoro. Não existe um dever de amar. E a mesma Constituição afirma que ninguém está obrigada a fazer ou a não fazer algo senão em virtude de lei.

Onde está o problema então? O problema reside justamente no fato de que existe uma linha muito tênue, hoje em dia, entre o namoro e a união estável. Por quê? Porque as pessoas fazem tudo junto, adquirem coisas juntas, viajam juntas; namorados e namoradas dormem um na casa do outro, às vezes, dividindo os dias da semana, parte na casa de um e parte na casa de outro, estão sempre publicamente juntos, aparentam “conviverem” enfim…

Nesse cenário, como saber onde termina uma coisa e começa outra? Claro que isso desafia o Direito, até porque as pessoas podem inclusive conviver nesse formato e não serem sequer namorados. Porém, pressupondo que seja um namoro, como resguardar o seu patrimônio pessoal de se misturar ou ser entendido como partilhável com o outro, de modo que, rompido o relacionamento, o outro não tenha êxito em reivindicar algum direito sobre o que é seu?

Como do amanhã ninguém sabe, profissionalmente, seria aconselhável que a pessoa que estiver nessa situação e com ela se preocupe que procurasse um profissional do Direito e tratasse de formalizar as regras patrimoniais dessa relação de namoro. Uma escritura pública, por exemplo, é fácil e rápida de ser feita.

Excesso de cautela? Talvez, porém, às vezes, a cautela sai em conta, isto é, sai barato, frente a um problemão e ante a possibilidade de se deixar para um terceiro (o juiz) decidir ou interpretar, com os valores dele, o que houve, juridicamente, entre você e o outro.

Com o contrato de namoro, não haverá discussão numa vara de família, mas o interessado estará, ao menos, municiado, em caso de uma demanda de dissolução de sociedade de fato, de uma prova do ajuste de vontades, aquele que dizia “como a banda iria tocar”.

Por outro lado, o contrato de namoro em si tem suscitado alguns problemas jurídicos, porque, não raro, em um completo desvirtuamento, as pessoas lançam mão dele para “camuflar” o que é, realmente, ou seja, escamotear uma união estável.

Isso ocorre quando a pessoa só lança mão do contrato de namoro porque quer disfarçar uma união estável e a incidência das normas do Direito de Família. Dito de um modo bem simples: o contrato é entabulado para fraudar o que a relação efetivamente é, no intuito de não haver direitos ou deveres próprios das uniões conjugais (inclusive sucessórios).

Essa “sacanagem” ou esse “faz de conta” também pode ser desfeito na Justiça, comprovando-se, por todos os meios de prova, que não se tratava de um namoro, mas de uma união estável; que o documento não corresponde à realidade; que é uma fraude.

Mas, afinal, como diferenciar o que é namoro do que é uma união estável, já que viajar junto, dormir junto, fazer tudo junto, de um modo permanente e de forma pública, não necessariamente na mesma casa, são elementos comuns a ambos os relacionamentos?

Um bom indicativo para diferenciar uma coisa da outra é que, na união estável, existe o objetivo de constituir família. Nossa legislação reconhece como união estável uma convivência pública, contínua e duradoura e que tem juntamente o objetivo de constituição familiar.
E o que é “duradoura” para a Justiça? Isso não está definido. O que definirá será a “intenção” da permanência na relação.

Agora, você pode estar se perguntando: o que é “constituir família”? Ter filhos? Bem, não é e pode, ao mesmo tempo, ser isso. Afinal, há milhares de casais que convivem em união estável, segundo uma verdadeira entidade familiar, sem ter filhos, ora por não quererem, ora porque não poderem tê-los, ou porque a união já se estabeleceu em idade mais madura ou avançada. Há uma família sem filhos.

A resposta, então, é: família tem como alicerce a socioafetiva duradoura, com vontade de família; com intenção de estabelecer um núcleo familiar e só o exame das características concretas de uma relação irá nos levar à conclusão sobre a que aquele relacionamento efetivamente é em termos jurídicos.

Silvia Regina Becker Pinto

Advogada e Professora. (espaço de coluna cedido à opinião do autor)

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