Geral

Alienação Autoinflingida

O Direito de Família foi um dos ramos do Direito que mais se rendeu aos influxos do processo de constitucionalização, em face de uma Constituição que abarcou parte expressiva de seu conteúdo, muito especialmente em razão dos valores superiores da humanidade por ela consagrados e que consistem o fundamento de toda nossa ordem jurídica: a família se desierarquizou (mulher e filhos têm voz e vez), se despatrimonializou (é na pessoa humana, e não nos bens, que repousa sua centralidade, ao mesmo tempo em que assumiu diversas outras conformações já muito distantes da única forma anteriormente prevista, dando primazia ao afeto e à solidariedade. São mudanças que buscam acompanhar os fatos que acontecem na sociedade concreta, a realidade.

De um tempo em que as crianças eram consideradas pequenos humanos praticamente sem direitos, passamos para uma época de proteção de sua voz e seus direitos. É em razão desse sistema de proteção que foi criada a Lei nº 12.318/2010, a Lei da Alienação Parental, com a finalidade de educar e balizar as atitudes dos pais para, após o final do relacionamento, não denegrirem a imagem um do outro perante o filho, com o objetivo de causar um afastamento. Nela, há previsão inclusive de penalização para a hipótese de os pais incidirem nessa conduta, pois não há que se admitir a desqualificação de um cônjuge em relação ao outro, perante os filhos comuns, por nenhuma forma de violência, no que se insere a violência psicológica, inserindo ou incutindo informações que façam o menor não ter interesse em conviver com o alienado ou indo para muito além disso.

Porém, um novo conceito vem entrando em cena: a auto-alienação parental que, dito de modo simples, ocorre quando o próprio genitor (pai ou mãe) “provoca” o afastamento do filho, por meio de determinadas atitudes, como, por exemplo, tratando o menor de maneira rude, com hostilidade e até desumana, o que pode se ocorrer dentro do próprio casamento ou quando rompida a relação conjugal, sendo, portanto, algo diferente da alienação parental tradicional que, comumente, acontece ao final da relação marital dos pais.

Cito alguns exemplos: o genitor (a) é rígido (a) e duro (a) com os filhos; avôs que não aceitam as escolhas dos netos; tios que fazem piadas depreciativas para com os sobrinhos; pais que não dão carinho; que apenas brigam com os filhos; que demonstram preferência por um filho em detrimento de outro. Ou, quando já finda a relação conjugal, se inserem em novo núcleo familiar (não raro, o pivô da separação) e nele obrigam o filho a conviver; quando, nessa situação, não fazem questão de nele inserir o filho, ou mesmo quando, nesse novo núcleo familiar, repetem comportamentos violentos com seus novos parceiros e, com isso, fazem o filho repelir o convívio, porque aqueles novos episódios de violência física, psicológica etc. rememoram outros sofridos vividos pelo filho no primeiro núcleo familiar, causando temor e dor, com o consequente repúdio e resistência no convívio, novos desafios que aportam à Justiça e exigem resposta e proteção.

Silvia Regina Becker Pinto

Advogada e Professora. (espaço de coluna cedido à opinião do autor)

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