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Ex-diretor do presídio de Bento Gonçalves contesta sindicância da Susepe

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Presídio de Bento Gonçalves enfrenta dificuldades históricas com superlotação (Fotos: arquivo)

A sindicância realizada pela corregedoria da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) para apurar as denúncias de irregularidades na administração do Presídio Estadual de Bento Gonçalves, aberta em novembro do ano passado depois que agentes penitenciários encaminharam um relatório ao Ministério Público (MP) e uma reportagem publicada pelo portal Leouvê mostrou que familiares de detentos denunciaram a existência de um comando paralelo entre os presos conhecido como “prefeitura”, foi concluída neste mês confirmando a existência de irregularidades.

De acordo com um comunicado da assessoria de comunicação da Susepe, a sindicância revelou “a existência de irregularidades sob responsabilidades do então diretor do estabelecimento, Evandro Antonio Simionatto, e da então Chefe de Segurança, Miriam Teresinha Borges da Silveira”, mas descartou “indícios de corrupção”.

Entre as irregularidades, o relatório aponta o “total descontrole da massa carcerária” e a “omissão quanto a manutenção de uma ‘prefeitura’ comandada por presos no interior da galeria”, além do “desvio de alimentos da cozinha geral para esta prefeitura, que produzia diversos tipos de alimentos e lanches a serem comercializados aos demais presos”.

Simionatto contesta as afirmações, alega inocência e diz que não foi notificado do fim da sindicância. “Não existe nenhuma prova concreta de qualquer responsabilidade administrativa a ser imputada a mim”, afirmou o ex-diretor da penitenciária, que revelou que, antes mesmo de que as denúncias contra ele fossem entregues ao MP, ele teria encaminhado relatórios à Corregedoria demonstrando problemas em relação a agentes penitenciários.

Alguns relatórios que enviei para a corregedoria contra colegas foram antes de meu nome ser denegrido por alguns agentes”, afirmou Simionatto.

Para a sindicância, tanto o ex-diretor quanto à então chefe de segurança do presídio tiveram responsabilidade por autorizar a entrada de alimentos “não permitidos nas administrações anteriores, tais como farinhas e fermento, os quais eram utilizados para confecção de alimentos a expensas do Estado, pois eram utilizados luz, água e gás do estabelecimento no preparo de alimentos, em prol de alguns presos privilegiados”. O relatório classifica os fatos como um “descontrole administrativo”.

Simionatto confirma que enfrentou dificuldades na gestão, mas garante que, se as irregularidades de fato ocorreram, elas teriam passado necessariamente pelos agentes de plantão, que têm a tarefa de verificar e revistar todo o material que entra no estabelecimento penal, e inibir a entrada de qualquer elemento proibido, além de registrar as ocorrências e até mesmo encaminhar boletim dos eventuais ilícitos na delegacia, o que, segundo ele, em nenhum momento de sua gestão teria ocorrido.

Se fosse eu o responsável por irregularidades, teria que autorizar e registrar para os agentes de plantão, e isso tenho certeza que não fiz. E no caso de Bento Gonçalves, o administrador trabalha no segundo piso, e muitas vezes não sabe o que está acontecendo na entrada do presídio, onde os agentes devem liberar ou inibir o que é ilícito”, garantiu.

No início de novembro, revista geral transferiu 10 presos considerados lideranças negativas
Em 2014, durante rebelião, cinco celas ficaram destruídas

Documentos

O portal Leouvê teve acesso com exclusividade a documentos que confirmam algumas informações do antigo administrador, como a Ordem de Serviço 07-2016, que determina que toda a denúncia recebida pelos agentes penitenciários deveria ser registrada e encaminhada também à polícia ou o ofício dirigido por Simionatto à 7ª Delegacia Penitenciária Regional (DPR) em que informa estar sendo vítima de “boicote” e de um “complô” por parte de “alguns agentes”. O documento afirma que o motivo seria a “antiga cultura de agir com violência e agressões” e solicita a indicação de novos agentes para cobrir a ausência de servidores em licença médica.

Essa situação é confirmada por Simionatto em um relatório de três páginas também encaminhado à DPR, onde enumera situações que estariam dificultando a administração do presídio, como rebeliões que teriam ocorrido “devido à falta de diálogo e à falta de preparo de alguns agentes” e as situações de “constante instabilidade” que, segundo ele, eram “criadas pelos agentes”. No relatório, o ex-diretor reforça a existência de “denúncias infundadas” e de “boicotes de alguns agentes”, e pede “apoio para continuar na administração do presídio”.

Foi este documento que deu origem ao relatório assinado por sete agentes penitenciários contendo as denúncias contra a administração do presídio encaminhado em novembro do ano passado ao MP, contestando todas as situações apontadas por Simionatto e que resultou na abertura da sindicância, inclusive com a utilização de imagens que, segundo o ex-diretor, seriam de uma festa que teria sido autorizada para comprovar as supostas irregularidades.

Uma das acusações feitas pelos agentes era que Simionatto estaria recebendo pagamentos dos presos para garantir privilégios, o que foi totalmente descartado pelas investigações da Susepe. “Após instrução e apuração dos fatos, não foi constatado indícios de corrupção por parte do então diretor”, afirma o comunicado da Susepe.

A Corregedoria da Susepe confirmou que o resultado da sindicância deverá ser encaminhado ao MP para avaliar as eventuais implicações penais do caso.

Para o ex-diretor, a ordem dos acontecimentos e a falta de provas nas acusações demonstram que ele sofria represálias internas a seu trabalho e comprovam que alguns problemas de relacionamento com colegas causaram empecilhos à administração e tumultos no andamento da casa prisional, com a existência do que chama de “boatos falsos com o intuito de denegrir a imagem do administrador”.

Além disso, Simionatto lembra que logo depois de sua saída uma revista realizada no presídio não encontrou irregularidades, e encerra relacionando os fatos a novos episódios ocorridos na penitenciária nas administrações posteriores a sua.

Não vou pagar e ficar calado por denúncias infundadas, nem que para isso tenha que ingressar na justiça comum”, revelou o ex-diretor.

Dos sete agentes penitenciários citados por Simionatto e que assinaram o relatório com as denúncias, cinco seguem trabalhando hoje na casa prisional, uma agente está em licença e outra solicitou a transferência do presídio de Bento Gonçalves.

A resposta da Susepe

A sindicância foi instaurada para apurar, entre outras coisas, possível conduta inadequada praticada pelo então administrador do Presídio Estadual de Bento Gonçalves, Agente Penitenciário Evandro Antônio Simionato, acusado, a princípio, de receber quantias em espécie para remanejar alguns presos para a uma determinada cela.

Após instrução e apuração dos fatos, não foi constatado indícios de corrupção por parte do então diretor, porém, foram detectados outros tipos de irregularidades na sua administração: Total descontrole da massa carcerária; Omissão quanto a manutenção de uma “prefeitura” comandada por presos no interior da galeria; Desvio de alimentos da cozinha geral para esta prefeitura que produzia diversos tipos de alimentos e lanches a serem comercializados aos demais presos.

A então chefe de segurança, Agente Penitenciária Miriam Terezinha Borges da Silveira, também se atribui as responsabilidades pelas irregularidades apontadas naquela administração.

Saliente-se que sempre existiu cantina no Presídio de Bento Gonçalves, entretanto, nesta administração, foi autorizado o ingresso de alimentos não permitidos nas administrações anteriores, tais como farinhas e fermento, os quais eram utilizados para confecção de alimentos a expensas do Estado, pois eram utilizados luz, água e gás do estabelecimento no preparo de alimentos, em prol de alguns presos privilegiados.

Como já referido, não foram detectadas indícios de corrupção por parte da administração, recebendo propinas para cometimentos de irregularidades por parte dos presos, mas sim, um descontrole administrativo que permitiu a ocorrência dos fatos apontados.

Quanto às questões penais e judiciais, cabe de direção ao Ministério Público e Poder Judiciário de Bento Gonçalves avaliar as implicações, para os quais está sendo encaminhada cópia integral da sindicância.

Quanto às questões de superlotação e interdições de estabelecimentos penais, cabem ao Departamento de Segurança Prisional da SUSEPE (DSEP), bem como as  revistas estruturais para apreensões de objetos ilícitos no interior dos presídios.”