Liberdade de expressão, liberdade de pressão

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12:55 - 12/09/2017

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Num tempo em que as diferenças são atacadas e as intolerâncias ganham força a cada dia por conta de um maniqueísmo renascido que divide o mundo entre nós e eles, direitas e esquerdas, comunistas e fascistas e todas as dualidades que reduzem o entendimento, sempre excludentes, incompletas e imperfeitas leituras da realidade, não é de estranhar a polêmica que envolveu a realização de uma exposição em Porto Alegre, que tencionava dar voz a sujeitos sociais geralmente marginalizados da sociedade.

Nada mais normal, porque, se uma das funções da arte é provocar, questionar e confrontar o senso comum pra intrigar e fazer nascer o debate e a reflexão, então toda a polêmica na arte é bem-vinda.

O que pode causar certa estranheza é que, diante das avassaladoras manchetes de corrupção e das malas de dinheiro, o país que não frequenta museus e não lê livros se descubra agora discutindo exatamente uma exposição de arte.

Ok, não é bem isso, e tá certo que a imensa maioria vocifera suas verdades superficiais em comentários entre iguais nas redes sociais. Mas até isso pode mesmo ser positivo.

E veja que eu não estou dizendo se a arte, nesse caso, é boa ou ruim, e nem se arte deve ser boa ou ruim.

O fato é que a tal exposição, com obras de consagrados como Cândido Portinari e Lygia Clark, foi rotulada por supostamente fazer apologia à pedofilia, à pornografia e à zoofilia porque algumas obras tratavam desses temas, o que, convenhamos, é um imenso exagero e, lá vai, mais uma redução que serve mais pra confundir e pra manter escondido do que pra debater e clarear.

Exatamente o oposto do que quer a arte. Qualquer arte. Toda arte.

Porque tratar de um assunto não pode simplesmente querer dizer defendê-lo, porque mostrar alguma coisa não pode apenas querer necessariamente dizer fazer propaganda dele.

O certo é que a arte e os artistas sempre enfrentaram os retrógrados e os conservadores de plantão, e, por isso mesmo, sempre causaram polêmica. E vão continuar causando.

Por isso, as decisões do banco que promovia a mostra podem ser questionadas, porque respondem a uma lógica de mercado, e não ao universo da arte; o uso de dinheiro captado pela renúncia fiscal pode ser questionado, porque em tese beneficiou quem não precisa ou mesmo quem não merece; o descumprimento das regras de classificação etária também pode ser questionado, assim como o gosto duvidoso das peças apresentadas.

Todo debate é válido, todo diálogo é permitido. Tudo é pertinente, até mesmo propor um boicote à exposição e ao banco, porque não?

Mas é preciso entender que tudo isso tem toda a validade. Se não porque é preciso garantir a liberdade de expressão, também porque mostra a maturidade de uma democracia onde as pessoas podem se manifestar pelo que acreditam.

E é claro que uma simples classificação de faixa etária poderia, em alguns, e nesse caso específico, até deveria, diminuir toda celeuma. Se, afinal, indicações etárias existem, porque prescindir delas, não é mesmo? Ainda assim, nada que o discernimento, o bom senso e o livre arbítrio não pudessem resolver em bom termo.

Não quer ver? Não vá! Mas se não quer que outros vejam, aí já são outro quinhentos.

Mas o que precisa ficar bem claro nesse episódio é que essa liberdade é uma via de mão dupla, e essa troca é que precisa ser garantida. A tolerância é o limite. Porque é o equilíbrio que preenche o espaço da dualidade, é a diversidade que ocupa as lacunas entre os extremos, é a diferença que aproxima os iguais e é a igualdade que celebra a diferença.

E, claro, porque é preciso entender que a arte não é religião e nem só diversão. Nem pão, nem circo. Não tem igreja e nem playground.

A arte é apenas, e ainda bem, tudo isso: o melhor lugar para debater.

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